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Em actualização…
A Acupunctura Em Odemira
A Cidade
A Formiga No Carreiro
A Morte Saiu À Rua
A Nau de António Faria
A Presença Das Formigas
Achégate A Mim, Maruxa
Adeus ó Serra da Lapa
Agora
Ailé! Ailé!
Alegria Da Criação
Ali Está o Rio
Alípio de Freitas
Altos Altentes
Altos Castelos
Arcebispíada
As Pombas
As Sete Mulheres Do Minho
Avenida De Angola
Ainda bem que é verdade
Ainda bem que é mentira
A acupunctura em Odemira
Ainda bem que há quem viva
Em Odeceixe
E se peide à vontade
Na Rua Espinha de Peixe
Eu bem sei a Cergal a Super Bock
A volta ao mundo pelo Cabo de S. Roque
Em Abril águas mil
Ponto final
Ainda bem que é para breve
O festival
Ainda bem que amanhã
É o ciclorama
E o campeonato do mundo no primeiro programa
Ainda bem que apostei no totobola
Todos os dias são santos, Dona Aurora
A Cidade (LP Contos velhos rumos novos(Letra de Ary dos Santos), 1969)
A cidade é um chão de palavras pisadas
A palavra criança a palavra segredo.
A cidade é um céu de palavras paradas
A palavra distância e a palavra medo
A cidade é um saco um pulmão que respira
Pela palavra água pela palavra brisa
A cidade é um poro um corpo que transpira
Pela palavra sangue pela palavra ira
A cidade tem praças de palavras abertas
Como estátuas mandadas apear
A cidade tem ruas de palavras desertas
Como jardins mandados arrancar
A palavra sarcasmo é uma rosa rubra.
A palavra silêncio é uma rosa chá
Não há céu de palavras que a cidade não cubra
Não há rua de sons que a palavra não corra
À procura da sombra de uma luz que não há
A formiga no carreiro
Vinha em sentido contrário
Caiu ao Tejo
Ao pé de um septuagenário
Larpou trepou às tábuas
Que flutuavam nas águas
E de cima de uma delas
Virou-se pró formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro
A formiga no carreiro
Vinha em sentido diferente
Caiu à rua
No meio de toda a gente
buliu buliu abriu as gâmbias
Para trepar às varandas
e do cimo de uma delas
Virou-se pró formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro
A formiga no carreiro
Andava à roda da vida
Caiu em cima
De uma espinhela caída
Furou furou à brava
Numa cova que ali estava
E de cima de uma delas
Virou-se pró formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro.
A morte saiu à rua num dia assim
Naquele lugar sem nome pra qualquer fim
Uma gota rubra sobre a calçada cai
E um rio de sangue dum peito aberto sai
O vento que dá nas canas do canavial
E a foice duma ceifeira de Portugal
E o som da bigorna como um clarim do céu
Vão dizendo em toda a parte o pintor morreu
Teu sangue, Pintor, reclama outra morte igual
Só olho por olho e dente por dente vale
À lei assassina à morte que te matou
Teu corpo pertence à terra que te abraçou
Aqui te afirmamos dente por dente assim
Que um dia rirá melhor quem rirá por fim
Na curva da estrada há covas feitas no chão
E em todas florirão rosas duma nação.
Vai-se a vida e vem a morte
O mal que a todos domina
Reina o comércio da china
Às cavalitas da sorte
Dinheiro seja louvado
A cruz de Cristo nas velas
Soprou o diabo nelas
Deu à costa um afogado
A guerra é coisa ligeira
Tudo vem do mal de ofício
Não pode haver desperdício
Nesta vida de canseira
Demanda o porto corsário
No caminho faz aguada
Ali findou seu fadário
Morreu de morte matada
A nau de António Faria
Leva no bojo escondida
A cabeça de uma corsário
Que lhes quis tirar a vida
Aljofre pérola rama
Eis os pecados do mundo
Assim vai a nau ao fundo
Sem arte a honra e a fama
Entre cristãos e gentios
Em gritos e altos brados
Para ganhar uns cruzados
Lançam-se mil desafios
Em vindo de veniaga
Com a vela solta ao vento
Um mouro é posto a tormento
Por não dizer quem lhe paga
Vou-me à costa à outra banda
Já vejo o rio amarelo
Foi no tempo do farelo
Agora é o rei quem manda
Faz-te à vela marinheiro
Rumo ao reino de sião
Antes do fim de janeiro
Hás-de ser meu capitão.
A presença das formigas
Nesta oficina caseira
A regra de três composta
Às tantas da madrugada
Maria que eu tanto prezo
E por modéstia me ama
A longa noite de insónia
Às voltas na mesma cama
Liberdade liberdade
Quem disse que era mentira
Quero-te mais do que à morte
Quero-te mais do que à vida
Achégate A Mim, Maruxa (LP Fura Fura (Letra Popular, Galiza), 1979)
Achégate a mim, Maruxa
chégate ben, moreniña
quérome casar contigo
serás miña mulleriña
Adeus, estrela brilante
compañeiriña da lua
moitas caras teño visto
mais como a tua ningunha
Adeus lubeiriña triste
de espaldas te vou mirando
non sei que me queda dentro
que me despido chorando
Adeus ó Serra da Lapa
adeus que te vou deixar
ó minha terra ó minha enxada
não faço gosto em voltar
Companheiros de aventura
vinde comigo viajar
a noite é negra a vida é dura
não faço gosto em voltar
Dou-te o meu lenço bordado
quando de ti me apartar
eu quero ir pró outro lado
não faço gosto em voltar
O meu dinheiro contado
é par quem me levar
o meu caminho está traçado
não faço gosto em voltar
Moirar a terra insegura
fugir de serra e do mar
meus companheiros de aventura
tudo farei pra salvar
Agora a vinha é doce
Em vinha d´alhos
Agora a frívola foi-se
O matutino
Agora a vírgula vai-se
A virgindade
Agora a quinta descanta
A mocidade
Agora a a pérola não
Se vai embora
Agora vai a filha
E vai a sogra
Agora não cheirava
A rosmaninho
Agora o Bento está
Mesmo sozinho
Agora pinta a chuva
Na goteira
Agora a filha já
Não tem papeira
Agora rima o novo
Rumo ao velho
Agora sabe bem
Este sossego
Limpa a bota
Cava na trincheira
Puxa-lhe
Pela crina
Corta as pinças
À centopeia
Põe-lhe uma pedra
Em cima
Mata a bicha
Que está bem cheia
Morde-lhe a perna
Fina
Corta a língua
Fura a traqueia
Que ela estrebucha
Ainda
Se ela assopra
Cospe-lhe à beira
Dá-lhe c´os pés
À bruta
Ninguém topa
Que é cuspideira
Salta-lhe
P’rà garupa
Tanto cavas
A cova funda
Que há-de acabar
A bicha
Põe-lhe a terra
Sobre a corcunda
P´ra não se ver
A crista
Plantei a semente da palavra
Antes da cheia matar o meu gado
Ensinei ao meu filho a lavra e a colheita
num terreno ao lado
A palavra rompeu
Cresceu como a baleia
No silêncio da noite à lua cheia
Vi mudar estações soprar a ventania
Brilhar de novo o sol sobre a baía
Fui um bom engenheiro um bom castor
Amei a minha amada com amor
De nada me arrependo só a vida
Me ensinou a cantar esta cantiga
Feiticeira
Mãe de todos nós
Flor da espiga
Maldita para tiranos
Amorosa te louvamos
tens mais de um milhão de anos
Rapariga
Quando o lume nos aquece
No grande frio de Inverno
Vem até nós uma prece
Que assim de longe parece
Uma cantiga
Magistrada Nossa natural
Vitoriosa
Curandeira dos aflitos
Amante de mil maridos
Há mais de um milhão de idos
tormentosa
Quando a fera encarcerada
Que dentro de nós suplanta
Quebra a gaiola sozinha
Voa voa endiabrada
Uma andorinha
Ali está o rio
Dois homens na margem estão
Um dá um passo, outro hesita
Só um se aventura outro não
Bom negócio faz um deles
Tem o triunfo na mão
Do outro lado do rio
Só um come o fruto, o outro não
Ao outro passado o p’rigo
Novos castigos virão
Se ambos venceram o rio
Só um tubo ganha o outro não
Na margem já conquistada
Só um venceu a valer
Perdeu o outro a saúde
Mas nada ganhou p’ra viver
Quem diz “nós” saiba ver bem
Se diz a verdade ou não
Ambos vencemos o rio
A mim quem me vence é o patrão
Baía de Guanabara
Santa Cruz na fortaleza
Está preso Alípio de Freitas
Homem de grande firmeza
Em Maio de mil setenta
Numa casa clandestina
Com a companheira e a filha
Caiu nas garras da CIA
Diz Alípio à nossa gente:
“Quero que saibam aí
Que no Brasil já morreram
Na tortura mais de mil
Ao lado dos explorados
No combate à opressão
Não me importa que me matem
Outros amigos virão”
Lá no sertão nordestino
Terra de tanta pobreza
Com Francisco Julião
Forma as ligas camponesas
Na prisão de Tiradentes
Depois da greve da fome
Em mais de cinco masmorras
Não há tortura que o dome
Fascistas da mesma igualha
(Ao tempo Carlos Lacerda)
Sabei que o povo não falha
Seja aqui ou outra terra
Em Santa Cruz há um monstro
(Só não vê quem não tem vista
Deu sete voltas à terra
Chamaram-lhe imperialista
Baía da Guanabara
Santa Cruz na fortaleza
Está preso Alípio de Freitas
Homem de grande firmeza
Altos altentes
carapinos carapentes
Dá-lhe uma risada
E caem-lhe os dentes
Igrejinha pequenina
Sacristão revolvedor
A gente que nela mora
Toda veste duma cor
Carvalheira tem cem canos
Cada cano tem cem ninhos
Cada ninho tem cem ovos
Quantos são os passarinhos
Altos castelos de branco luar
Linda menina que vai casar
Torres cinzentas que dão para o vento
Dentro do meu pensamento
Eu lá na serra não sou ninguém
Se fores p’rà guerra eu irei também
Irei também numa barca bela
Cinta vermelha e saia amarela
Na praia nova caiu uma estrela
Moças trigueiras ide atrás dela
Rola rolinha garganta de prata
Canta-me uma serenata
Eu lá na serra não sou ninguém
Se fores p’rà guerra eu irei também
Irei também numa barca bela
Cinta vermelha e saia amarela
Um cavalinho de crina na ponta
Leva à garupa uma bruxa tonta
Duas meninas a viram passar
Mesmo à beirinha do mar
Eu lá na serra não sou ninguém
Se fores p’rà guerra eu irei também
Irei também numa barca bela
Cinta vermelha e saia amarela
Pregais o Cristo de Braga
Fazeis a guerra na rua
Sempre virados p’rò céu
Sempre virados p’rà Virgem
A Santa Cruzada manda
Matar o chibo vermelho
Contra a foice e o martelo
Contra a alfabetização
Curai de ganhar agora
Os vossos novos clientes
Além do pide e do bufo
Amigos do usurário
Além do latifundiário
Amigo do Capelão
“Abre Nuncio Vade Retro
Querem vender a nação”
“A medicina é ateia
Não cuida da salvação”
Que o diga o facultativo
Que o diga o cirurgião
Que o digam as criancinhas
“Rezas sim, parteiras não”
Se o Pinochet concordasse
Já em Fátima haveria
Mais de trinta mil vermelhos
A arder de noite e de dia
Caridade, a quanto obrigas
Só trinta mil voluntários
“Cristo reina Cristo vinga”
Nos vossos santos ovários
E também nos lampadários
E também nos trintanários
Abre Nuncio Vade Retro
Querem vender a nação
Ó Carnaval da capela
Ó liturgia do altar
Já lá vem Camilo Torres
Com o seu fusil a sangrar
Igreja dos privilégios
Mataste o Cristo a galope
Também Franco, o assassino
Mandou benzer o garrote
Pombas brancas
Que voam altas
Riscando as sombras
Das nuvens largas
Lá vão
Pombas que não voltam
Trazem dentro
Das asas prendas
Nas bicos rosas
Nuvens desfeitas
No mar
Pombas do meu cantar
Canto apenas
Lembranças várias
Vindas das sendas
Que ninguém sabe
Onde vão
Pombas que não voltam
As sete mulheres do Minho
mulheres de grande valor
Armadas de fuso e roca
correram com o regedor
Essa mulher lá do Minho
que da foice fez espada
há-de ter na lusa história
uma página doirada
Viva a Maria da Fonte
com as pistolas na mão
para matar os Cabrais
que são falsos à nação
Dum botão de branco punho
Dum braço de fora preto
Vou pedir contas ao mundo
Além naquele coreto
Lá vai um a lá vão duas
Três pombas a descansar
Uma é minha outra é tua
Outra é de quem a agarrar
Na sala há cinco meninas
E um botão de sardinheira
Feitas de fruta madura
Nos braços duma rameira
Lá vai uma lá vão duas…
O Sol é quem faz a cura
Com alfinete de dama
Na sala há cinco meninas
Feitas duma capulana
Lá vai uma lá vão duas…
Quando a noite se avizinha
Do outro lado da rua
Vem Ana, vem Serafina
Vem Mariana, a mais pura
Lá vai uma lá vão duas…
Há sempre um botão de punho
Num braço de fora preto
Vou pedir contas ao mundo
Além naquele coreto
Lá vai uma lá vão duas…
Ó noite das columbas
Leva-as na tua algibeira
Na sala há cinco meninas
Feitas da mesma maneira
Lá vai uma lá vão duas…
Bailia
Balada Aleixo
Balada Do Outono
Balada do Sino
Barracas Ocupação
Benditos
Bailemos nós já todas três, ai amigas,
so aquestas avelaneiras frolidas
e quem for velida, como nós, velidas,
se amig’ amar,
so aquestas avelaneiras frolidas
verá bailar.
Bailemos nós já todas tres, ai irmañas,
so aqueste ramo d’ estas avelañas
e quem for louçana, como nós, louçanas
se amig’ amar,
so aqueste ramo d’ estas avelanas
verá bailar.
Por Deus, ai amigas, mentr’ al non fazemos,
so aqueste ramo frolido bailemos
e quen ben parecer, como nós parecemos,
se amig’ amar,
so aqueste ramo so l[o] que nós bailemos
verá bailar.
Quem canta por conta sua
Canta sempre com razão
Mais vale ser pardal na rua
Que rouxinol na prisão
Adeus que me vou embora
Adeus que me quero ir
Deita cá esses teus olhos
Que me quero despedir
Com os cegos me confundo
Amor desde que te vi
Nada mais vejo no mundo
Quando não te vejo a ti
Adeus que me vou embora
Adeus que me quero ir
Deita cá esses teus olhos
Que me quero despedir
Águas passadas do rio
Meu sono vazio
Não vão acordar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai
Que eu não volto
A cantar
Rios que vão dar ao mar
Deixem meus olhos secar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai
Que eu não volto
A cantar
Águas do rio correndo
Poentes morrendo
P’ras bandas do mar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai
Que eu não volto
A cantar
Rios que vão dar ao mar
Deixem meus olhos secar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai
Que eu não volto
A cantar
Uma barquinha
Lá vem lá vem
Dim Dem
Na barquinha de Belém
Senhor Barqueiro
Quem leva aí
Dao Dim
Na barquinha d’Aladim
Levo a cativa
Duma só vez
Dois, três
Na barquinha do Marquês
Ao romper d’alva
Casada vem
Dim Dem
Na barquinha é que vai bem
Se a tem guardada
Deixe-a fugir
Dao Dim
Na barquinha do Vizir
Lá vai roubada
Lá vai na mao
Dim Dão
Na barquinha do ladrão
1. Lá vêm subindo o abismo
Lá vêm subindo o abismo
Da sombra donde vieram
Já sem medo e sem vergonha
Virados p’rà luz do dia
Será esta a nossa porta?
Perguntavam um pouco inquietos
Por terem p’la vez primeira
Quatro paredes e um tecto
Por certo ninguém lhes disse
Que são os heróis de agora
Maiores que Alexandre Magno
Numa batalha perfeita
Sem perguntar ao Estado
Qual o caminho a tomar
Correm risco correm penas
Quem sabe onde vão parar
2. Lá vêm os nossos soldados
Lá vêm os nossos soldados
Esses, sim, sabemos quem são
Os nossos filhos, os nossos irmãos
Os nossos pais, diz a criança
Não tenhamos medo
Pois ninguém melhor
Poderá resolver
esta luta
A favor de quem?
Ao lado de quem?
Vamos, coragem, chegou o momento
De preparar os nossos argumentos
Não tenhamos medo
São nossos amigos
São os nossos filhos,
Os nossos irmãos
Os nossos pais, diz a criança
Já estão a dobrar a rua
Lá vêm eles
Não tenhamos medo
Pois ninguém melhor
Poderá resolver
Esta luta
3. Maravilha Maravilha
Maravilha Maravilha
Venham ver o barco doido
Sem amarras que o segurem
Pela porta entra a maré
Venham ver a barco doido
Água cai pela chaminé
Maravilha Maravilha
Já vejo os móveis dançar
Entra a água pela porta
O telhado vai tombar
Quando o mar se enfurece
Andamos em rodopio
Sobre caminhos de prata
Correm lágrimas a fio
Já fui neve no mar
Já fui espada na mão
Já fui a corda da lira a vibrar
Já fui servo de um Deus
Vida e morte num momento
Já nasci no barlavento
Já fui erva no chão
Bendito seja o pão
Bendita seja a flor
Benditas as portas do amor
Já fui servo de um Deus
Vida e morte de um momento
Já nasci no barlavento
Já fui erva no chão
Já fui favo de mel
Cajado de pastor
Já fui nuvem correndo no céu
Já fui ceptro de um rei
Arco-íris num instante
Já fui vento do levante
Já fui andarilho e cantor
Bendita seja a paz
Bendita sejas tu
Benditos os peixes do azul
Já fui ceptro de um rei
Arco-íris num instante
Já fui vento do levante
Já fui andarilho e cantor
Canção da Paciência
Canção De Embalar
Canção do Desterro (Emigrantes)
Canção do Mar
Canção do Medo
Canção Longe
Canção do Vai… e Vem
Canta Camarada
Cantar Alentejano
Cantares do Andarilho
Cantiga Do Monte
Cantigas Do Maio
Canto Moço
Carta a Miguel Djéjé
Chamaram-me Cigano
Chula da Póvoa
Com As Minhas Tamanquinhas
Como Se Faz Um Canalha
Coro da Primavera
Coro Dos Caídos
Coro dos Tribunais
Muitos sóis e luas irão nascer
Mais ondas na praia rebentar
Já não tem sentido ter ou não ter
Vivo com o meu ódio a mendigar
Tenho muitos anos para sofrer
Mais do que uma vida para andar
Beba o fel amargo até morrer
Já não tenho pena sei esperar
A cobiça é fraca melhor dizer
A vida não presta para sonhar
Minha luz dos olhos que eu vi nascer
Num dia tão breve a clarear
As águas do rio são de correr
Cada vez mais perto sem parar
Sou como o morcego vejo sem ver
Sou como o sossego sei esperar
Dorme meu menino a estrela d’alva
Já a procurei e não a vi
Se ela não vier de madrugada
Outra que eu souber será p’ra ti
Outra que eu souber na noite escura
Sobre o teu sorriso de encantar
Ouvirás cantando nas alturas
Trovas e cantigas de embalar
Trovas e cantigas muito belas
Afina a garganta meu cantor
Quando a luz se apaga nas janelas
Perde a estrela d’alva o seu fulgor
Perde a estrela d’alva pequenina
Se outra não vier para a render
Dorme qu’inda a noite é uma menina
Deixa-a vir também adormecer
Canção do Desterro (Emigrantes) (LP Traz Outro Amigo Também, 1970)
Vieram cedo
Mortos de cansaço
Adeus amigos
Não voltamos cá
O mar é tão grande
E o mundo é tão largo
Maria Bonita
Onde vamos morar
Na barcarola
Canta a Marujada
– O mar que eu vi
Não é como o de lá
E a roda do leme
E a proa molhada
Maria Bonita
Onde vamos parar
Nem uma nuvem
Sobre a maré cheia
O sete-estrelo
Sabe bem onde ir
E a velha teimava
E a velha dizia
Maria Bonita
Onde vamos cair
À beira de água
Me criei um dia
– Remos e velas
Lá deixei a arder
Ao sol e ao vento
Na areia da praia
Maria Bonita
Onde vamos viver
Ganho a camisa
Tenho uma fortuna
Em terra alheia
Sei onde ficar
Eu sou como o vento
Que foi e não veio
Maria Bonita
Onde vamos morar
Sino de bronze
Lá na minha aldeia
Toca por mim
Que estou para abalar
E a fala da velha
Da velha matreira
Maria Bonita
Onde vamos penar
Vinham de longe
Todos o sabiam
Não se importavam
Quem os vinha ver
E a velha teimava
E a velha dizia
Maria Bonita
Onde vamos morrer
Ó mar
Ó mar
Ó mar profundo
Ó mar
Negro altar
Do fim do mundo
Em ti nasceu
Ó mar
A noite que já morreu
O teu olhar
Ó mar
Ó mar
Ó mar profano
Ó mar
Verde mar
Em que me irmano
Em ti nasceu
Ó mar
A noite que já morreu
No teu olhar
Minha mãe como não morro
à vista desta carnagem
Dou por mal paga a viagem
a tais foguetes não corro
Não sei dos meu lavagantes
nem da mulher que me espera
Quero sair desta guerra
mesmo agora neste instante
Ai carnes do meu padrinho
podeis temer à vontade
Que a vida do teu sobrinho
vale bem a tua idade
E mais a tua canseira
em me ensinares que não dorme
Aquele que mata a fome
a quem só tem caganeira
Livra-me dos teus cuidados
rezo dois mil padre-nossos
Assim me cuidem dos ossos
sejam eles mil diabos
Agora tenho cagaço
como quando era menino
e me tolhiam os braços
temores ao verbo Divino
Levanta ferro meu corpo
vê se podes dar um passo
Valham-me todos os santos
das caminhadas que faço
Tão pouco pode a natura
nestas afrontas mortais
Que um homem morre mil vezes
mil e uma já é demais.
Ó meu bem se tu te fores
Como dizem que te vais
Deixa-me o teu nome escrito
Numa pedrinha do cais
Quando o mê mano se foi
Sete lenços encharquei
mai la manga da camisa
e dizem que não chorei
Meu amor vem sobre as ondas
Meu amor vem sobre o mar
Ai quem me dera morrer
Nas águas do teu olhar
Em rosa clara te vi
Rosa morta te deixei
Em rosa clara
algum dia te verei
Na lua vinda te fiz
Lua finda te entreguei
Eras ela o que seria
saberei
Ai amor amores
tenho eu mais dum cento
bonecas primores
cabeças de vento
cabeças de vento
não as quero eu não
ai amor amores
do meu coração
Em noite larga te ardi
madrugada te apaguei
num retorno que te viva
te amarei
Em rosa clara te vi
Rosa morta te diexei
Em rosa clara
algum dia te verei
Ai amores, amores
tenho eu mais dum cento
bonecas primores
cabeças de vento
Cabeças de vento
não as quero eu não
ai amor, amores
do meu coração
Canta camarada canta
canta que ninguém te afronta
que esta minha espada corta
dos copos até à ponta
Eu hei-de morrer de um tiro
Ou duma faca de ponta
Se hei-de morrer amanhã
morra hoje tanto conta
Tenho sina de morrer
na ponta de uma navalha
Toda a vida hei-de dizer
Morra o homem na batalha
Viva a malta e trema a terra
Aqui ninguém arredou
nem há-de tremer na Guerra
Sendo um homem como eu sou
Chamava-se Catarina
O Alentejo a viu nascer
Serranas viram-na em vida
Baleizão a viu morrer
Ceifeiras na manhã fria
Flores na campa lhe vão pôr
Ficou vermelha a campina
Do sangue que então brotou
Acalma o furor campina
Que o teu pranto não findou
Quem viu morrer Catarina
Não perdoa a quem matou
Aquela pomba tão branca
Todos a querem p´ra si
Ó Alentejo queimado
Ninguém se lembra de ti
Aquela andorinha negra
Bate as asas p´ra voar
Ó Alentejo esquecido
Inda um dia hás-de cantar
Já fiz recados às bruxas
do caselho à portelada
dei-lhes a minha inocência
elas não me deram nada.
Andei à giesta
ao lírio maninho
na Bouça da Fresta
no Casal Velido
erva cidreira
à erva veludo
na Lomba regueira
no Pinhal do Mudo.
Andei ó licranço
andei ao lacrau
no Monte do Manso
na Espera do Mau
vibra à carocha
ao corujão cego
na mata da Tocha
no rio Lagedo.
Fui andarilho das bruxas
moço de S. Cipriano
já fui morto e inda vivo
vendi a alma ao Diabo.
Era donzel e guardei-me
p´ras filhas da feiticeira
parti-me em metade à loira
noutra metade à morena.
Fragância morena
Portal de marfim
Ondina açucena
Chamando por mim
Cantiga do monte
Clareira do ar
Dançando na nuvem
Mudando em mar
Na flor da montanha
Na espuma a cair
Nos frutos de Agosto
Na boca a sorrir
Na crista da vaga
Tormento alonguei
No vento e na fraga
Só luto encontrei
Abriram-se as velas
Mal rompe a manhã
Na luz e nas trevas
Foi-se a louçã
Ai húmida prata
Meu sonho sem ver
Ai noite de Lua
Meu lume de arder
Ó finas areias
Ó clara manhã
Ó rubras papoilas
Da cor da romã
Ó rosto da terra
E abismos do mar
Ouvide o seu canto
De longe a arfar
Abriram-se as velas
Mal rompe a manhã
Na luz e nas trevas
Lá vai a louçã
Da morte zombando
Na aurora lunar
Num jardim suspenso
Do seu folgar
Eu fui ver a minha amada
lá prós lados dum jardim
dei-lhe uma rosa encarnada
para se lembrar de mim
Eu fui ver o meu benzinho
lá prós lados dum paçal
dei-lhe o meu lenço de linho
que é do mais fino bragal
Minha mãe quando eu morrera
ai chore por quem muito amargou
para então dizer ao mundo
ai Deus mo deu ai Deus mo levou
Eu fui ver uma donzela
numa barquinha a dormir
dei-lhe uma colcha de seda
para nela se cobrir
Eu fui ver uma solteira
numa salinha a fiar
dei-lhe uma rosa vermelha
para de mim se encantar
Minha mãe quando eu morrer…
Eu fui ver a minha amada
lä nos campos eu fui ver
dei-lhe uma rosa encarnada
para de mim se prender
Verdes prados verdes campos
onde está minha paixão
as andorinhas não param
umas voltam outras não
Minha mãe quando eu morrer…
Somos filhos da madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor no ramo
Navegamos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de manhã clara
Lá do cimo de uma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Mensageira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Lá do cimo de uma montanha
Onde o vento cortou amarras
Largaremos p’la noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca, brisa, moira encantada
Vira a proa da minha barca.
Diga amigo Miguel
Como está você?
Em todo o Xipamanine
Já ninguém o vê
Vou dar-lhe a minha viola
Para tocar outra vez
O seu valor um dia
Você mostrou
Todo o mainato o ouvia
E até dançou
Miguel só você sabia
Tocar como já tocou
Vinha maningue gente
Para aprender
Moda lá da sua terra
Bonita a valer
O Jaime e o Etekinse
Amigos não volt´haver
Quando a noite se ouvia
Miguel tocar
Também havia a marimba
Para acompanhar
A noite
Na Ponta Geia
Amigos hei-de recordar
O barco foi andando
E a Nanga vi
Foi a saudade aumentando
Longe daí
A gente
Na minha terra
Não canta assim
Como eu ouvi
Chamaram-me um dia
Cigano e maltês
Menino, não és boa rés
Abri uma cova
Na terra mais funda
Fiz dela a minha sepultura
Entrei numa gruta
Matei um tritão
Mas tive o diabo na mão
Havia um comboio
Já pronto a largar
E vi O diabo a tentar
Pedi-lhe um cruzado
Fiquei logo ali
Num leito de penas dormi
Puseram-me a ferros
Soltaram o cão
Mas tive o diabo na mão
Voltei da charola
de cilha e arnês
Amigo, vem cá outra vez
Subi uma escada
Ganhei dinheirama
Senhor D. Fulano Marquês
Perdi na roleta
Ganhei ao gamão
Mas tive o diabo na mão
Ao dar uma volta
Caí no lancil
E veio o diabo a ganir
Nadavam piranhas
Na lagoa escura
Tamanhas que nunca tal vi
Limpei a viseira
Peguei no arpão
Mas tive o diabo na mão
Em Janeiro bebo o vinho
Em Fevereiro como o pão
Nem que chovam picaretas
Hás-de cair, Rei-Milhão
Adeus, cidade do Porto
Adeus muros de Custóias
Cantando à chuva e ao vento
Andei a enganar as horas
Tenho mais de mil amigos
Aqui não me sinto só
Cantarei ao desafio
Ninguém tenha de mim dó
Ó meu Portugal formoso
Berço de latifundiários
Onde um primeiro ministro
Já manda a merda os operários
Já hoje muito maroto
Se diz revolucionário
E faz da bolsa do povo
Cofre-forte do bancário
Camaradas lá do Norte
Venham ao Sul passear
Cá nas nossas cooperativas
Há sempre mais um lugar
Com As Minhas Tamanquinhas (LP Com as Minhas Tamanquinhas, 1976)
A fadiga é um dom da natureza
Chiça!
Com as minhas tamanquinhas
Com as minhas
Com as minhas tamanquinhas
P´ra quem não faz fortuna
Mata as penas e faz covinhas
Pela calçada desliza o operário
A modista
O alfaiate
Metidos num alicate
Depois da festa, menina
Muita gente se amofina
E o banqueiro? A ferrugem?
E a canalha?
Meta-os na forma
Queime-os na fornalha
Como Se Faz Um Canalha (LP Com as Minhas Tamanquinhas, 1976)
Conheci-te ainda moço
Ou como tal eu te via
Habitavas o Procópio
Ias ao Napoleão
Mas ninguém sabia ao certo
Como se faz um canalha
Se a memória me não falha
Tinhas o mundo na mão
Alguma gente enganaste
(A fé da muita amizade
Tem também as suas falhas
Hoje fazes alianças
A bem da Santa União
Em abono da verdade
A tua Universidade
Tem mesmo um nome: Traição
Um social-democrata
Não foge ao Grão-Timoneiro
Basta citar o paleio
O major psicopata
Já são tantos namorados
Só falta o Holden Roberto
Devagar se vai ao longe
Nunca te vimos tão perto
Nunca te vimos tão longe
Daquilo que tens pregado
Nunca te vimos tão fora
Da vida do Zé Soldado
Ninguém mais te peça meças
No fulgor dos gabinetes
Hás-de acabar às avessas
Barricado até aos dentes
És um produto de sala
Rasputim cá dos Cabrais
Estas sempre em traje de gala
A brincar aos carnavais
Nos anais do mundanismo
A nossa história recente
Falará com saudosismo
Dum grande Lugar-Tenente
São tudo favas-contadas
No país da verborreia
Uma brilhante carreira
Dá produto todo o ano
Digamos p’ra ser exacto
Assim se faz um canalha
Se a memória não me falha
Já te mandei p’rò Caetano
Cobre-te canalha
Na mortalha
Hoje o rei vai nu
Os velhos tiranos
De há mil anos
Morrem como tu
Abre uma trincheira
Companheira
Deita-te no chão
Sempre à tua frente
Viste gente
Doutra condição
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Livra-te do medo
Que bem cedo
Há-de o Sol queimar
E tu camarada
Põe-te em guarda
Que te vão matar
Venham lavradeiras
Mondadeiras
Deste campo em flor
Venham enlaçadas
De mãos dadas
Semear o amor
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Venha a maré cheia
Duma ideia
P´ra nos empurrar
Só um pensamento
No momento
P´ra nos despertar
Eia mais um braço
E outro braço
Nos conduz irmão
Sempre a nossa fome
Nos consome
Dá-me a tua mão
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Cantai bichos da treva e da aparência
Na absolvição por incontinência
Cantai cantai no pino do inferno
Em Janeiro ou em maio é sempre cedo
Cantai cardumes da guerra e da agonia
Neste areal onde não nasce o dia
Cantai cantai melancolias serenas
Como o trigo da moda nas verbenas
Cantai cantai guizos doidos dos sinos
Os vossos salmos de embalar meninos
Cantai bichos da treva e da opulência
A vossa vil e vã magnificência
Cantai os vossos tronos e impérios
Sobre os degredos sobre os cemitérios
Cantai cantai ó torpes madrugadas
As clavas os clarins e as espadas
Cantai nos matadouros nas trincheiras
As armas os pendões e as bandeiras
Cantai cantai que o ódio já não cansa
Com palavras de amor e de bonança
Dançai ó parcas vossa negra festa
Sobre a planície em redor que o ar empesta
Cantai ó corvos pela noite fora
Neste areal onde não nasce a aurora
Foram-se os bandos dos chacais
Chegou a vez dos tribunais
Vão reunir o bom e o mau ladrão
Para votar sobre um caixão
Quando o inocente se abateu
Inda o morto não morreu
Quando o inocente se abateu
Inda o morto não morreu
A decisão do tribunal
É como a sombra do punhal
Vamos matar o justo que ali jaz
Para quem julga tanto faz
Já que o punhal não mata bem
A lei matemos também
Já que o punhal não mata bem
A lei matemos também
Soa o clarim soa o tambor
O morto já não sente a dor
Quando o deserto nada tem a dar
Vêm as águias almoçar
O tribunal dá de comer
Venham assassinos ver
O tribunal dá de comer
Venham assassinos ver
Se o criminoso se escondeu
Nada de novo aconteceu
A recompensa ao punho que matou
Uma fortuna a quem roubou
Guarda o teu roubo guarda-o bem
Dentro de um papel a lei
De Não Saber o Que Se Espera
De Quem Foi a Traição
De Sal de Linguagem Feita
Década de Salomé
Deus Te Salve, Rosa
De não saber o que me espera
Tirei a sorte à minha guerra
Recolhi sombras onde vira
Luzes de orvalho ao meio-dia
Vítima de só haver vaga
Entre uma mão e uma espada
Mas que maneira bicuda
De ir à guerra sem ajuda
Viemos pelo sol nascente
Vingamos a madrugada
Mas não encontramos nada
Sol e água sol e água
De linhas tortas havia
Um pouco de maresia
Mas quem vencer esta meta
Que diga se a linha é recta
José do Telhado
Sozinho e perdido
É um lobo do mato
Acossado
De quem foi a traição?
De quem foi a traição?
José do Telhado
Trocado e vendido
É um lobo
Do mato
Fugido
De quem foi a traição?
De quem foi a traição?
José do Telhado
O traidor
Que o vendeu
Bem merece
Sofrer
O castigo
De quem foi a traição?
De quem foi a traição?
José do Telhado
Vai-se vingar
O traidor vai pagar
O traidor vai pagar
De sal de linguagem feita
Numa verruma que atava
A língua presa do jeito
A forma de ser escrava
O apito do comboio
Que não dizia de onde era
O sinal, a mordedura
A visita que não vem
O corredor, o tapume
A sala vedada às feras
O frenesim das gibóias
Em guarda, o soldo, a comida,
A cozedura do pleito
O cheiro a papel selado
Um cantinho de amargura
Um raio de sol queimado,
Junto do bolso do fato
A morte a vida a vitória
Diga lá minha menina
Se acredita nesta história
Vai terminar esta prosa
Estamos na década de Salomé
Será o Apocalipse ou a torneira
a pingar no bidé?
É meio dia dia de feira
mensal em Vila Nogueira
Estamos na década do bricolage
Diz o jornal que um emigra
morreu afogado em Mira
Antes da data
Do mariage
Estamos na Europa
civilizada
já cá faltava
uma maison
pour la patrie
p´lo Volkswagen
acabou-se a forragem
viva o patron!
Já tem destino esta terra
vamos mudar para o marché aux puces
o tempo das ceroilas está no fio
agora só de trousses.
É meio dia dia de feira
mensal em Vila Nogueira
Estamos na década do bricolage
Diz o jornal que um emigra
morreu afogado em Mira
Antes da data
Do mariage.
Saem quarenta mil ovos moles
Vilar Formoso
é logo ali
faz-se um enxerto
com mijo de gato
Sola de sapato
voilá Paris!
Aos grandes supermercados
chega cultura num bi-camion
Camões e Eça vendem-se enlatados
lavados com «champon»
É meio dia dia de feira
mensal em Vila Nogueira
Estamos na década do bricolage
Diz o jornal que um emigra
morreu afogado em Mira
Antes da data
Do mariage
Estamos na Europa
radarizada
já cá faltava
uma turquês
para o controle
do bravo e do manso
vivaço e do tanso
em cada mês!
A fina flor do entulho
largou o pêlo ganhou verniz
Será o Christian Dior o manajeiro
a mandar no país?
Estamos da Europa
do «estou-me nas tintas»
nada de colectivismos
chacun por si, meu
e chacun por soi
tê vê e cama
depois da esgaça
até que lhes dê a traça
a culpa é toda
do erre Hagá.
Levam-te à caça
dos gambuzinos
com dois ouriços
em cada mão
ai velha fibra
do bairro de Alfama
a carcaça do Gama
vai a leilão!
Deus te salve, Rosa
lindo Serafim
Tão linda pastora
que fazes aí?
Que fazes aqui,
no monte c´o gado?
Mas que quer, Senhor,
nasci pr´a este fado.
No monte c´o gado,
corre grande p´rigo
Quer a menina
venir-se comigo?
Mas não quero, não, não,
tão alto criado
de meias de seda
sapato delgado.
Sapatos e meias
tudo romperei
por amor da menina
a vida darei.
Vá-se ó magano
Não me cause mais ódio
Que há-dem vir meus amos
Trazer-me o almoço.
Que venham os teus amos
Isso é o que eu gosto
Quero que eles vejam
Que eu falo com gosto.
É para Urga
Elegia
Em Terras de Trás-os Montes
Endechas A Bárbara Escrava
Enquanto Há Força
Epígrafe Para A Arte De Furtar
Era de Noite e Levaram
Era Um Redondo Vocábulo
Escandinávia Bar-Fuzeta
Eu Dizia
Eu Marchava de Dia e de Noite
Eu Vou Ser Como A Toupeira
Eu, o Povo
É para urga
Que a gente vai
Para urga caminho
Caminho para lá
Em urga os bandidos
Não me hão-de apanhar
Eu hei-de vencer
Eu hei-de vencer
Entre mim e urga
O deserto que houver
Em urga recebo
A maquia e então
Vou tirar proveito
Do meu ganha-pão
O vento desfolha a tarde
O vento desfolha a tarde
Como a dor desfolha o peito
Como a dor desfoha o peito.
Na roseira do meu peito
Na roseira do meu peito
Senhora meu bem fermosa
Senhora meu bem fermosa.
Vai-se a tarde ficam penas
Vai-se a tarde ficam penas
Na roseira do meu peito
Na roseira do meu peito.
Senhora por quem eu morro
Senhora por quem eu morro
Senhora meu bem fermosa
Senhora meu bem fermosa.
Em Terras de Trás-os Montes (LP Com as Minhas Tamanquinhas, 1976)
Em terras de Trás-os-Montes
Entre Coelhoso e Parada
Uma história verdadeira
Foi ali mesmo contada
Algemado por dois pides
Na manha de vinte e três
La vai Manuel Augusto
Sem mesmo saber porquê
Com ele vai Marcolino
Bufo dos Dominadores
Ide às minas da Ribeira
Vereis quem são os Senhores
Nesse lugar de trabalho
Nos confins da exploracão
Diz o Marcolino aos pides
Apertem-me esse cabrão
Não contente com a prova
Do zelo que assim mostra
Àquele rapaz honrado
Esta fala então lhe dava:
Sabemos da tua vida
Amanhã por esta hora
Irás para o forte de Elvas
Diz adeus à vida boa
Também o José António
Foi na mesma interrogado
Assassino Marcolino
Foste o primeiro culpado
Entre Parada e Coelhoso
Ainda reina a opressão
Não deixem fugir o melro
Não quebrem vossa união
Aquela cativa que me tem cativo,
Porque nela vivo já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa em suaves molhos,
Que pera meus olhos fosse mais formosa.
Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.
Uma graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.
Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo;
E pois nela vivo,
É força que viva.
Enquanto há força
No braço que vinga
Que venham ventos
Virar-nos as quilhas
Seremos muitos
Cantai rapazes
Dançai raparigas
E vós altivas
Cantai também
Levanta o braço
Faz dele uma barra
Que venha a brisa
Lavar-nos a cara
Seremos muitos
Seremos alguém
Cantai rapazes
Dançai raparigas
E vós altivas
Cantai também
Epígrafe Para A Arte De Furtar (LP Traz Outro Amigo Também, 1970)
Roubam-me Deus
Outros o diabo
Quem cantarei
Roubam-me a Pátria
e a humanidade
outros ma roubam
Quem cantarei
Sempre há quem roube
Quem eu deseje
E de mim mesmo
Todos me roubam
Quem cantarei
Quem cantarei
Roubam-me Deus
Outros o diabo
Quem cantarei
Roubam-me a Pátria
e a humanidade
outros ma roubam
Quem cantarei
Roubam-me a voz
quando me calo
ou o silêncio
mesmo se falo
Aqui d’El Rei.
Era de noite e levaram
Era de noite e levaram
Quem nesta cama dormia
Nela dormia, nela dormia
Sua boca amordaçaram
Sua boca amordaçaram
Com panos de seda fria
De seda fria, de seda fria
Era de noite e roubaram
Era de noite e roubaram
O que na casa havia
na casa havia, na casa havia
Só corpos negros ficaram
Só corpos negros ficaram
Dentro da casa vazia
casa vazia, casa vazia
Rosa branca, rosa fria
Rosa branca, rosa fria
Na boca da madrugada
Da madrugada, da madrugada
Hei-de plantar-te um dia
Hei-de plantar-te um dia
Sobre o meu peito queimada
Na madrugada, na madrugada
Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar,
Pelos degraus de Laura
A tinta caía
No móvel vazio,
Congregando farpas
Chamando o telefone
Matando baratas
A fúria crescia
Clamando vingança,
Nos degraus de Laura
No quarto das danças
Na rua os meninos
Brincando e Laura
Na sala de espera
Inda o ar educa
Se o gageiro de outras eras
Subisse de novo à gávea
Diria p´rá marinhagem
Já se avista a “escandinávia”
Senhora do Bom Sucesso
Diz-me onde irei almoçar
Não quero sola de molho
Tenho as tripas a estalar
Entra naquele fiorde
Onde a terra encobre o mar
Se queres comer como um lord
no Escandinávia-bar
Sem rendas de mesa fina
O choco é bicho moderno
Naquele lugar fraterno
Goza de geral estima
Já vai passando à história
O tempo em que não entrava
Um pescador no café
Onde a finesse abancava
Nesses tempos de castigo
(Só de pensar estremeço)
Dizia cá pra comigo
nem tudo o que digo penso
Ali não entra o Tenreiro
Nem cavalos de alta roda
Mas já lá vi um torneiro
Beber whisky com soda
À puridade vos digo
Desde a noite ao romper d´alva
Comi uns chocos com tinta
Vi um búzio a bater palmas
Digo tudo quanto é franco
Em prol da sardinha assada
Vi rebentar as costuras
De um fulana alentada
Por isso não te retenhas
Se tens pressa de chegar
Senhora do Bom Sucesso
Rumo ao Escandinávia-bar
Eu dizia
Quanto madura
me animavas
Seguindo a noite
Barco ou estrada
Sem rótulo
Sem luzes
Em vitória
Na mesma rota
De tanto compatriota
Entre o sol e a lua
Sereníssima
Rodavas em silêncio
noite fora
Fazíamos um norte
De vigília
Do lado da montanha
Ninguém chora
Eu marchava de dia e de noite
Mais do que um dia de avanço ganhei
Só o forte tem sorte
Para o fraco é o chicote
Mais que um dia de avanço ganhei
Mais que um dia de avanço ganhei
Só o forte resiste ao combate
Sabe que o coolie que não há outra lei
Ó petroléo da terra
Hei-de ter-te na guerra
Só a morte é que sabe o que eu sei
Só a morte é que sabe o que eu sei
O homem conquista a vitória
Sobre o deserto e o rio também
É ele que se vence
e domina
e alcança
O petroléo que a todos convém
A morte é para o fraco e o combate
É para o forte – foi Deus que mandou
Ao rico uma ajuda e ao pobre uma surra
Foi assim que o planeta girou
Foi assim que o planeta girou
Quem cai já não torna a cair
Deixa-o ficar porque assim está bem
À mesa da fama assentou-se quem mama
É assim porque à gente convém
É assim porque à gente convém
Só os mortos não comem a mesa
E o cozinheiro não se incomodou
E quem fez o patrão também fez o criado
Foi assim que o planeta girou
Foi assim que o planeta girou
Quando tudo te corre a prazer
Vem amigos estender-te a mão
Mas se Deus ou o Diabo
Viram tudo ao contrário
Ninguém vem levantar-te do chão
Ninguém vem levantar-te do chão
Eu Vou Ser Como A Toupeira (LP Eu Vou ser Como a Toupeira, 1972)
Eu vou ser como a toupeira
Que esburaca
Penitência, diz a hidra
Quando há seca
Eu vou ser como a gibóia
Que atormenta
Não há luz que não se veja
Da charneca
E não me digas agora
Estás à espera
Penitência diz a hidra
Quando há seca
E se te enfias na toca
És como ela
Quero-me à minha vontade
Não na tua
Ó hidra, diz-me a verdade
Nua e crua
Mais vale dar numa sargeja
Que na mão
De quem nos inveja a vida
E tira o pão
Eu, o Povo
Conheço a força da terra que rebenta a granada do grão
Fiz desta força um amigo fiel
O vento sopra com força
A água corre com força
O fogo arde com força
Nos meus braços que vão crescer vou estender panos de vela
Para agarrar o vento e levar a força do vento à produção
As minhas mãos vão crescer até fazerem pás de roda
Para agarrar a força da água e pô-la na produção
Os meus pulmões vão crescer soprando na forja do coração
Para agarrar a força do fogo na produção
Eu, o Povo
Vou aprender a lutar ao lado da Natureza
Vou ser camarada de armos dos quatro elementos
A táctica colonialista é deixar o Povo ao natural
Fazendo do Povo um inimigo da Natureza
Eu, o Povo Moçambicano
Vou conhecer as minhas grandes forças todas
Foi Na Cidade do Sado
Foi No Sábado Passado
Fui À Beira do Mar
Fura Fura
Foi na cidade do Sado
No pavilhão do Naval
Havia uma bronca armada
Pelas bestas do capital
Aos sete do mês de Março
Quinta-feira já se ouvia
Dizer a boca calada
Que o PPD era a CIA
Uma tarjeta laranja
Convite ao povo fazia:
Venham todos ao comício
Da Social Democracia
Eram talvez quatrocentos
Gritando a plenos pulmões:
Abaixo o capitalismo
Não queremos mais tubarões
Lá dentro sessenta manos
Do PPD exibiam
Matracas e armas de fogo
E o mais que os outros não viam
A um sinal combinado
Já quente a polícia vem
Arreia, polícia, arreia
Que o Totta-Acores paga bem
Amigo arrebenta a porta
Que te vão para matar
As bestas já fazem fogo
Lá fora tens de lutar
Os gases lacrimogénios
E os tiros que então partia
Mais os cordões da polícia
Os Pê Pê Dês protegiam
Cai morto João Manuel
De nascimento algarvio
Dezoito já eram feridos
Ficou o Naval vazio
Justiça pela noite fora
Pediu o povo na rua
Morte à polícia assassina
Amigo a vitória é tua
Aos onze do mesmo mês
Às onze horas do dia
Enquanto o João passava
Enquanto o João jazia
Do outro lado do rio
Morre o soldado Luís
Soldado filho do Povo
Vamos fazer um País
Foi no sábado passado
muitos compagni vieram
à manife que fizeram
no lugar mais afamado
ali todos juntos eram
muitos mil do nosso lado
Aos gritos de Franco boia
(Franco, Soares, Pinochet)
já Roma lembrava Tróia
na garrota tutti tre
vinguemos os cinco mortos
morte ao fascismo: vencer!
Dia internacionalista
não faltava o militar
apoiando os companheiros
portugueses e a cantar:
“Viva Portogallo Rosso”
“Criar Poder Popular”
Quisera lembrar agora
naquela semana finda
esquerda rivolucionária
Vanguarda e Lotta Cantinua
toda a força a classe operária
ouve-se em Lisboa ainda
Franco boia Franco boia
todo o crime tem um preço
o teu regime corrupto
pôs todo a mundo do avesso
hoje Espanha está de luto
mas inda agora é o começo
Fui à beira do mar
Ver a que lá havia
Ouvi uma voz cantar
Que ao lange me dizia
Ó cantador alegre
Que é da tua alegria
Tens tanto para andar
E a noite está tão fria
Desde então a lavrar
No meu peito a Alegria
Ouço alguém a bradar
Aproveita que é dia
Sentei-me a descansar
Enquanto amanhecia
Entre o céu e o mar
Uma proa rompia
Desde então a bater
No meu peito em segredo
Sinto uma voz dizer
Teima, teima sem medo
Veio lá da terra
Um homem
Tentar a ventura
Põe a roupa
Na maleta
Lá vai de abalada
Não pensa em voltar
Faz como a formiga
Fura fura
Fura sem parar
Pela estrada fora
Era já
Meia-noite
Só cães a ladrar
A chuva na terra
O vento no mar
Um velho voltou
E disse-me adeus
Cantando e dançando
Debaixo do céu
“Que é pena, que é mágoa
Que uma ave de penas
Não possa voar”
Às vezes
Não tenho jeito
P´ra falar de amigos
Meu amigo
Passageiro
Dá-me o teu capote
Para me abrigar
Vai num barco à vela
Numa aduela
Vai fazer-se ao mar
Passaram-se os dias
Dias da
Vida dum cavalo
A galopar
E o homem a andar
E o homem a andar
Um velho voltou
E disse-me adeus
Cantando e dançando
Debaixo do céu
“Que é pena, que é mágoa
Que uma ave de penas
Não possa voar”
Gastão Era Perfeito
Grândola Vila Morena
Gastão era perfeito
Conduzido por seu dono
Em sonolências afeito
Às picadas dos mosquitos
Era Gastão milionário
Vivia em tapetes raros
Se lhe viravam as costas
Chamava logo a polícia
Em crises de malquerência
Vinha-lhe o gosto pela soda
Mas ninguém se abespinhava
Que enviuvasse às ocultas
Nem Gastão se apercebia
De quanto a vida o prendara
Entre estiletes de prata
E colchas de seda fina
Gastão era deste jeito
Fazia provas reais
Gastão era um parapeito
De Papas e Cardeais
Vinha-lhe só por fastio
Nos tiquetaques da vida
Um solene desfastio
Pela mãe que era entrevada
Mandava bombons recados
Por mensageiros aflitos
Não fora Gastão dos fracos
E já seria ministro
Conheci-o em Alverca
Num bidon de gasolina
Tinha um pneu às avessas
Mas de asma é que sofria
Nos solestícios de Junho
A quem o quisesse ouvir
Dizia que era sobrinho
Do Fernão Peres de Trava
Querem saber de Gastão?
Vão ao Palácio da Pena
Usa agora capachinho
E gosta de codornizes
Tem um sinal que o indica
Como o mais forte Doutor
Espeta o dedo no queixo
E diz que é Nosso Senhor
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade
Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade
Já o tempo se habitua
A estar alerta
Não há luz
Que não resista
À noite cega
Já a rosa
Perde o cheiro
E a cor vermelha
Cai a flor
Da laranjeira
À cova incerta
Água mole
Água bendita
Fresca serra
Lava a língua
Lava a lama
Lava a guerra
Já o tempo
Se acostuma
À cova funda
Já tem cama
E sepultura
Toda a terra
Nem o voo
Do milhano
Ao vento leste
Nem a rota
Da gaivota
Ao vento norte
Nem toda
A força do pano
Todo o ano
Quebra a proa
Do mais forte
Nem a morte
Já o mundo
Se não lembra
De cantigas
Tanta areia
Suja tanta
Erva daninha
A nenhuma
Porta aberta
Chega a lua
Cai a flor
Da laranjeira
À cova incerta
Nem o voo do milhano …
Entre as vilas
E as muralhas
Da moirama
Sobre a espiga
E sobre a palha
Que derrama
Sobre as ondas
Sobre a praia
Já o tempo
Perde a fala
E perde o riso
Perde o amor
Lá No Xepangara
Lá Vai Jeremias
Lá no Xepangara
Vai nascer menino
Dentro da palhota
Tem a seu destino
Lá no Xepangara
Fica muito bem
Deitado na esteira
Ao lado da mãe
Há-de ter um nome
Lá prò fim do ano
Se morrer de fome
Tapa-se com um pano
Se tiver já corpo
Rega-se com vinho
Se não cair morto
Chama-se menino
Se tiver umbigo
Corta-se à navalha
Tira-se uma tripa
Faz-se uma mortalha
Pretinho de raça
Sempre desconfia
Se o musungo passa
Diz muito bom dia
Quando for mufana
E já pedir pão
Dá-se uma lambada
Vem comer à mão
Mais uma patada
Vai-te embora cão
Dá-se-lhe porrada
Porque é mandrião
Lá prò fim do ano
Quando já for moço
Guarda-se o tutano
Fica pele e osso
Quando já for homem
Tira-se o retrato
Come na cozinha
Chama-se mainato
Se mudar de vida
Vai para o contrato
No fundo da mina
Fica mais barato
Quando já for velho
Chama-se tratante
Dá-se-lhe aguardente
Morre num instante
Lá vai Jeremias
Lá vai Jeremão
Lá vai senhor alferes
Melhor capitão
Ó Elvas, ó Elvas
Ó Penamacor
Neste regimento
Anda o meu amor
Além mais abaixo
Se vende aguardente
A dez reis o copo
Para toda a gente
À entrada de Elvas
Estão duas cadeiras
Para se assentarem
As moças solteiras
Ai que quebra, quebra
que se quebra o linho
Quebra a loiça toda
Fica o prato fino
Além mais abaixo
Se vende licor
A dez reis o copo
Para o meu amor
Maio, Maduro Maio
Maria
Maria Faia
Menina Dos Olhos Tristes
Menino do Bairro Negro
Menino D’ Oiro
Milho Verde
Minha Mãe
Moda do Entrudo
Mulher Da Erva
Maio maduro Maio, quem te pintou?
Quem te quebrou o encanto, nunca te amou.
Raiava o sol já no Sul.
E uma falua vinha lá de Istambul.
Sempre depois da sesta chamando as flores.
Era o dia da festa Maio de amores.
Era o dia de cantar.
E uma falua andava ao longe a varar.
Maio com meu amigo quem dera já.
Sempre no mês do trigo se cantará.
QuÂ’importa a fúria do mar.
Que a voz não te esmoreça vamos lutar.
Numa rua comprida El-rei pastor.
Vende o soro da vida que mata a dor.
Anda ver, Maio nasceu.
Que a voz não te esmoreça a turba rompeu.
Maria
Nascida no monte
À beira da estrada
Maria
Bebida na fonte
Nas ervas criada
Talvez
Que Maria se espante
De ser tão louvada
Mas não
Quem por ela se prende
De a ver tão prendada
Maria
Nascida do trevo
Criada na trigo
Quem dera
Maria que o trevo
Casara comigo
Prouvera
A Maria sem medo
Crer no que lhe digo
Maria
Nascida no trevo
Beiral do mendigo
Maria
Nascida no trevo
Beiral do mendigo
Maria
De todas primeira
De todas menina
Maria
Soubera a cigana
Ler a tua sina
Não sei
Se deveras se engana
Quem demais se afina
Maria
Sol da madrugada
Flor de tangerina
Maria
Sol de madrugada
Flor de tangerina
Eu não sei como te chamas
Ó Maria Faia
Nem que nome te hei-de eu pôr
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
Cravo não que tu és Rosa
Ó Maria Faia
Rosa não, que tu és flor
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
Não te quero chamar Cravo
Ó Maria Faia
Que te estou a engrandecer
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
Chamo-te antes Espelho
Ó Maria Faia
Onde espero de me ver
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
O meu amor abalou
Ó Maria Faia
Deu uma linda despedida
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
Abarcou-me a mão direita
Ó Maria Faia
Adeus ó prenda querida
Ó Maria Faia, ó Faia Maria
Menina Dos Olhos Tristes (SINGLE Menina dos Olhos Tristes, 1969)
Menina dos olhos tristes
o que tanto a faz chorar
o soldadinho não volta
do outro lado do mar
Vamos senhor pensativo
olhe o cachimbo a apagar
o soldadinho não volta
do outro lado do mar
Senhora de olhos cansados
porque a fatiga o tear
o soldadinho não volta
do outro lado do mar
Anda bem triste um amigo
uma carta o fez chorar
o soldadinho não volta
do outro lado do mar
A lua que é viajante
é que nos pode informar
o soldadinho já volta
está mesmo quase a chegar
Vem numa caixa de pinho
do outro lado do mar
desta vez o soldadinho
nunca mais se faz ao mar
O meu menino é d’oiro
É de oiro fino
Não façam caso que é pequenino
O meu menino é d’oiro
D’oiro fagueiro
Hei-de levá-lo no meu veleiro.
Venham aves do céu
Pousar de mansinho
Por sobre os ombros do meu menino
Do meu menino, do meu menino
Venha comigo venham
Que eu não vou só
Levo o menino no meu trenó.
Quantos sonhos ligeiros
pra teu sossego
Menino avaro não tenhas medo
Onde fores no teu sonho
Quero ir contigo
Menino de oiro sou teu amigo
Venham altas montanhas
Ventos do mar
Que o meu menino
Nasceu pra amar
Venha comigo venham
Que eu não vou só
Levo o menino no meu trenó.
O meu menino é d’oiro
É d’oiro é de oiro fino ….
Venham altas montanhas
Ventos do mar…
Olha o sol que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar
Menino sem condição
Irmão de todos os nus
Tira os olhos do chão
Vem ver a luz
Menino do mal trajar
Um novo dia lá vem
Só quem souber cantar
Vira também
Negro bairro negro
Bairro negro
Onde não há pão
Não há sossego
Menino pobre o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há-de um dia cantar
Esta canção
Olha o sol que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar
Se até da gosto cantar
Se toda a terra sorri
Quem te não há-de amar
Menino a ti
Se não é fúria a razão
Se toda a gente quiser
Um dia hás-de aprender
Haja o que houver
Negro bairro negro
Bairro negro
Onde não há pão
Não há sossego
Menino pobre o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há-de um dia cantar
Esta canção
Milho verde, milho verde
Milho verde maçaroca
À sombra do milho verde
Namorei uma cachopa
Milho verde, milho verde
Milho verde miudinho
À sombra do milho verde
Namorei um rapazinho
Milho verde, milho verde
Milho verde folha larga
À sombra do milho verde
Namorei uma casada
Mondadeiras do meu milho
Mondai o meu milho bem
Não olhais para o caminho
Que a merenda já lá vem
Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada
Quem tem uma mãe tem tudo
Quem não tem mãe não tem nada
Quem não tem mãe não tem nada
Quem a perde é pobrezinho
Ó minha mãe minha mãe
Onde estás que estou sózinho
Estou sózinho no mar largo
Sem medo à noite cerrada
Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada
Ó entrudo ó entrudo
Ó entrudo chocalheiro
Que não deixas assentar
As mocinhas ao solheiro
Eu quero ir para o monte
Eu quero ir para o monte
Que no monte é qu’eu estou bem
Que no monte é qu’eu estou bem
Eu quero ir para o monte
Eu quero ir para o monte
Onde não veja ninguém
Que no monte é qu’eu estou bem
Estas casa são caiadas
Estas casa são caiadas
Quem seria a caiadeira
Quem seria a caiadeira
Foi o noivo mais a noiva
Foi o noivo mais a noiva
Com um ramo de laranjeira
Quem seria a caiadeira
Velha da terra morena
Pensa que é já lua cheia
Vela que a onda condena
Feita em pedaços na areia
Saia rota subindo a estrada
Inda a noite rompendo vem
A mulher pega na braçada
De erva fresca supremo bem
Canta a rola numa ramada
Pela estrada vai a mulher
Meu senhor nesta caminhada
Nem m’alembra do amanhecer
Há quem viva sem dar por nada
Há quem morra sem tal saber
Velha ardida velha queimada
Vende a fruta se queres comer
À noitinha a mulher alcança
Quem lhe compra do seu manjar
Para dar à cabrinha mansa
Erva fresca da cor do mar
Na calçada uma mancha negra
Cobriu tudo e ali ficou
Anda, velha da saia preta
Flor que ao vento no chão tombou
No Inverno terás fartura
Da erva fora supremo bem
Canta rola tua amargura
Manhã moça … nunca mais vem
Na Catedral de Lisboa
Na Fonte Está Lianor
Não é Meu Bem
Não Seremos Pais Incógnitos
Natal Dos Simples
Nefretite Não Tinha Papeira
No Comboio Descendente
No Lago Do Breu
No Vale Fuenteovejuna
Na Catedral de Lisboa
Sinto os sinos repicar
Serão anos de princesa
De algum santo festejar
É a rainha que parte
Até às terras de Tomar
Na Catedral de Lisboa
Sinto os sinos repicar
Em formoso palafrém
Bem a vejo cavalgar
Um mui brilhante cortejo
Atrás dela a caminhar
Segue a estrada que vai ter
Até às terras de Tomar
Em formoso palafrém
Bem o vejo cavalgar
Dizem que a nossa rainha
O vem hoje visitar
Mal haja quem a conduz
a um tal coito se abrigar
Segue a estrada que vai ter
Até às terras de Tomar
Em formoso palafrém
Bem a vejo cavalgar
Na Fonte Está Lianor
lavando a talha e chorando
Às amigas perguntando
Vistes lá o meu amor
Nisto estava Lianor
o seu desejo enganando
Às amigas perguntando
Vistes lá o meu amor
O rosto sobre uma mão
Os olhos no chão pregados
Que de chorar já cansados
Algum descanso lhe dão
Na Fonte Está Lianor
lavando a talha e chorando
Às amigas perguntando
Vistes lá o meu amor
A pele é seca para curtir
– nao é meu bem
A cara é magra para sorrir
– nao é meu bem
A cama é boa para dormir
– nao é meu bem
A corda é boa para subir
– nao é meu bem
A morte é santa para cumprir
– nao é meu bem
A louça é cara para partir
– nao é meu bem
A cal é branca para encobrir
– nao é meu bem
A banca é boa para falir
– nao é meu bem
A vida é dura para resistir
– nao é meu bem
A porta é boa para se abrir
– nao é meu bem
Não seremos pais incógnitos
Netos de filhos ignaros
Mas nestes livros avaros
Só moralizam os tolos
Quem tem farelos tem quintas
Diz o bom rei ao soldado
No tempo em que o rei Fernando
Passava por ser honrado
No tempo em que Dona Márcia
Filha de Mércia Condessa
Cantava Chácaras do tempo
Em que era madre abadessa
Também depunha o meirinho
Filho de D. Charlatão
Há que vidas os não via
Mas sei de que filhos são
Vamos cantar as janeiras
Vamos cantar as janeiras
Por esses quintais adentro vamos
Às raparigas solteiras
Vamos cantar orvalhadas
Vamos cantar orvalhadas
Por esses quintais adentro vamos
Às raparigas casadas
Vira o vento e muda a sorte
Vira o vento e muda a sorte
Por aqueles olivais perdidos
Foi-se embora o vento norte
Muita neve cai na serra
Muita neve cai na serra
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem tem saudades da terra
Quem tem a candeia acesa
Quem tem a candeia acesa
Rabanadas pão e vinho novo
Matava a fome à pobreza
Já nos cansa esta lonjura
Já nos cansa esta lonjura
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem anda à noite à ventura
Nefretite não tinha papeira
Tuthankamon apetite
Já minha avó me dizia
Olha que a sopa arrefece
Nos funerais de antanho
As capicuas gritavam
E às escuras na cozinha
Já as galinhas dormiam
Manolo era o rei do fandango
Do fandaguilho picado
Maria se fores ao baile
Leva o casaco castanho
O rei João era dos tesos
Chamavam-lhe João dos Quintos
Lá na terra brasileira
Vinham quintais de Ouro Preto
Em suma a soma interessava
A quem interessa algum dia
De lingotes e pimentas
Ainda vamos ao fundo
Lá para o reino da Arábia
Havia amêndoas aos centos
Que grande rebaldaria
E a Palestina às escuras
Os Sheikes israelitas
Já que estou com a mão na massa
Lembram-me os Sheikes das fitas
Que dão porrada a quem passa
No Comboio Descendente (LP Eu Vou Ser Como a Toupeira, 1972)
No comboio descendente
Vinha tudo a gargalhada
Uns por verem rir os outros
E os outros sem ser por nada
No comboio descendente
De queluz á cruz-quebrada
No comboio descendente
Vinham todos á janela
Uns calados para os outros
E os outros sem dar-lhes trela
No comboio descendente
Da cruz-quebrada a palmela
No comboio descendente
Mas que grande reinação
Uns dormindo outros com sono
E os outros nem sim nem não
No combóio descendente
De Palmela a Portimão
No lago do Breu,
Sem luzes no céu nem bom Deus
Que venha abrasar os ateus,
No lago do Breu.
No lago do Breu,
A noite não vem sem sinais
Que fazem tremer os mortais,
No lago do Breu.
Mas quem não for mau, não vá
Que o céu não se comprará
Não vejo a razão p’ro ser
Quem teme e não quer viver
Sem luzes no céu só mesmo como eu
No lago do Breu.
No lago do Breu,
Os dedos da noite vão juntos
Para amortalhar os defuntos,
No lago do Breu.
No lago do Breu,
A lua nasceu mas ninguém
Pergunta quem vai ou quem vem
No lago do Breu.
Mas quem não for mau, não vá
Que o céu não se compra dá
Não vejo a razão p’ro ser
Quem teme e não quer viver
Sem luzes no céu só mesmo como eu,
No lago do Breu.
No lago do Breu,
Meninas perdidas eu sei,
Mas só nestas vidas me achei,
No lago do Breu.
No vale de Fuenteovejuna
cabelos aos vento estava
seguida pelo cavaleiro
o da cruz de Calatrava
entre a ramada se esconde
de vergonhosa e turbada
-Para que te escondes
moça formosa
desejos???
paredes removem
Acercou-se o cavaleiro
e ela confusa e turbada
gelosias quis fazer
das ramas emaranhadas
mas como tem amores
as montanhas e os mares
atravessa facilmente
disse-lhe estas palavras
-Para que te escondes
moça formosa
desejos???
paredes removem
No vale de Fuenteovejuna
cabelos aos vento estava
seguida pelo cavaleiro
o da cruz de Calatrava
entre a ramada se esconde
de vergonhosa e turbada
-Para que te escondes
moça formosa
desejos???
paredes removem
O Avô Cavernoso
O Cabral Fugiu Para Espanha
O Canarinho
O Cavaleiro e o Anjo
O Dia da Unidade
O Homem Da Gaita
O Homem Voltou
Ó Minha Amora Madura
O País Vai de Carrinho
O Pastor de Bensafrim
O Que Faz Falta
Ó Ti Alves
Oh! Que Calma Vai Caindo
Os Bravos
Os Eunucos
Os Fantoches de Kissinger
Os Índios da Meia-praia
Ó Vila de Olhão
Os Vampiros
O avô cavernoso
Instituiu a chuva
Ratificou a demora
Persignou-se
Ninguém o chora agora
Perfumou-se
Vinte mil léguas de virgens vieram
Inutéis e despidas
Flores de malva
E a boina bem segura
Sobre a calva
Ao avô cavernoso quem viu a tonsura?
E a tenda dos milagres e a privada?
Na tenda que foi nítida conjura
As flores de malva murcham devagar
Devagar
Até que se ouvem gritos, matinadas
Ele que só nos trouxe a maior miséria encontra-se a pagar a sua vilania num exílio vergonhoso em terra de Espanha.
Provou-se que o povo tinha razão. E provou-se também que a unidade de todos os cidadãos há-de levar de vencida essa corte corrupta e indigna.
Temos de exigir medidas revolucionárias ao nosso governo. Não podemos permitir que o Duque de Palmela, o nosso ministro, continue nas mesmas águas turvas do Costa Cabral. Se não é capaz de tomar medidas que sirvam o povo, que vá para lá outro.
Aprende Rainha aprende
Mede bem o teu poder
Tu dum lado o povo d´outro
Qual dos dois há-de vencer
O Cabral fugiu p´ra Espanha
Com uma carga de sardinha
Com a pressa que levava
Nem disse adeus à Rainha
Viva a Maria da Fonte
Ve com esporas de prata
A cavalo na Rainha
Com o Saldanha á arreata
O Cabral queria ser rei
A mulher quer ser rainha
Foram-se os Cabrais embora
Só ficou a Luisinha
O Cabral fugiu para Espanha
Já lá vai para a Galiza
Com a pressa que levava
Nem disse adeus à Luisa
O canarinho cai
No cantarinho ai
Do canarinho
O cantarinho cai
Na canarinho ai
Do canarinho
O alarido sai
Do arruído ai
Do alarido
O arruído sai
Do alarido ai
Do arruído
O vagabundo vai
A cada mundo ai
Do vagabundo
A cada mundo vai
O vagabundo ai
Do cada mundo
O cavalinho vai
De vagarinho ai
Do cavalinho
O vagarinho vai
De cavalinho ai
Do vagarinho
Passos da noite
Ao romper do dia
Quantos se ouviram
Marchando a par
Batem à porta
Da hospedaria
Se for o vento
Manda-o entrar
Vejo uma espada
De sombra esguia
Se for o vento
Que venha só
Quem está lá fora
Traz companhia
Botas cardadas
Levantam pó
Venho de longe
Sem luz nem guia
Sou estrangeiro
Não sou ninguém
Na flor queimada
Na cinza fria
Nunca se passa
Uma noite bem
Foge estrangeiro
Da morte escura
Pega nas armas
Vem batalhar
E enquanto a lua
Não se habitua
Dorme ao relento
Até eu voltar
Há muito tempo
Que te não via
(Um anjo negro
Me vem tentar)
Batem a porta
Da hospedaria
É aqui mesmo
Que eu vou ficar
No dia da unidade
Joaquim Carvalho Luís
Pelas forças em parada
Lembrado foi no RAL – 1
Onze de Março sabido
Dentro e fora de fronteiras
Para todos garantido
De que já não há barreiras
Que venham dividir homens
Da mesma conformação
Por essas montanhas fora
Faremos a revolução
Numa assembleia de tropas
Delegados da unidade
Decidiram em directo
Que reinaria a igualdade
Falaram cabos e praças
Oficiais e sargentos
Houve compromisso aberto
De liquidar os intentos
Da velha ordem fascista
Dinheiro nunca lhe falta
Terão que passar por cima
Das sentinelas da malta
Seja o RAL – 1 o modelo
Duma luta popular
Se vos tocam num cabelo
Podeis connosco contar
Havia na terra
Um homem que tinha
Uma gaita bem de pasmar
Se alguém a ouvia
Fosse gente ou bicho
Entrava na roda a dançar
Um dia passava
Um sujeito e ao lado
Um burro com louça a trotar
O dono e o burro
Ouvindo a tocata
Puseram-se logo a bailar
Partiu-se a faiança
Em cacos c’o a dança
E o pobre pedia a gritar
Ao homem da gaita
Que acabasse a fita
Mas nada ficou por quebrar
O Juiz de fora
Chamado na hora
“Só tenho que te condenar
Mas quero uma prova
Se é crime ou se é trova
Faz lá essa gaita tocar”
O homem da louça
Sentado na sala
Levanta-se e põe-se a saltar
Enquanto a rabeca
Não se incomodava
A sua cadeira era o par
Pulava o jurista
De quico na crista
Ninguém se atrevia A parar
E a mãe entrevada
Que estava deitada
Levanta-se E põe-se a bailar
Vá de folia vá de folia
Que há sete anos me não mexia
O homem voltou ao solar do amigo
O homem queimou um cigarro na testa
O homem voltou calculando o destino
Andou mais um passo e não viu
Matava ele o tempo numa outra azinhaga
E a voz era fraca ninguém o ouvia
A larva estendia e o sol abrasava
A marcha do tempo parou
Havia uma vala na rua comprida
E a porta travava ninguém o espera
O homem cavava uma cova na vida
Ali nem o céu se calou
Trazia uma ruga na cara comprida
Não vinha pra nada não vinha por nada?
E a rua era larga e a rua era fria
Andou mais um passo e tombou
Havia uma hora que havia uma vida
Que o homem andava que o homem corria
E a porta travava e um tiro partia
A marcha do tempo parou
O homem voltou ao solar do amigo
E a casa era escura e a porta batia
O homem queimou um cigarro na testa
Andou mais um passo e tombou
Na volta era a noite
Chupava-se a vida
Que há tempo e medida
Chupava-se a vida
O homem precisa é dum´outra cantiga
Agora que o frio voltou
Ó minha amora madura
Diz-me quem te amadurou
Foi o sol, foi a geada
O calor que ela apanhou
O país vai de carrinho
Vai de carrinho o país
Os falcóes das avenidas
São os meninos nazis
Blusão de cabedal preto
Sapato de bico ou bota
Barulho de escape aberto
Lá vai o menino-mota
Gosta de passeio em grupo
No mercedes que o papá
Trouxe da Europa connosco
Até à Europa de cá
Despreza a ralé inteira
Como qualquer plutocrata
Às vezes sai para a rua
De corrente e de matraca
Se o Adolfo pudesse
Ressuscitar em Abril
Dançava a dança macabra
Com os meninos nazis
Depois mandava-os a todos
Com treze anos ou menos
Entrar na ordem teutónica
Combater os sarracenos
Os pretos, os comunistas
Os Índios, os turcomanos
Morram todos os hirsutos!
Fiquem só os arianos !
Chame-se o Bufallo Bill
Chegue aqui o Jaime Neves
Para recordar Wiriamu,
Mocumbura e Marracuene
Que a cruz gamada reclama
e novo o Grão-Capitão
Só os meninos nazis
Podem levar o pendão
Mas não se esquecam do tacho
Que o papá vos garantiu
Ao fazer voto perpétuo
De ir prà puta que o pariu
Ó ventos do monte
Ó brisas do mar
A história que vou contar
Dum pastor Florival
Meu irmão de Bensafrim
Natural rezava assim
Passava ele os dias
No seu labutar
E os anos do seu folgar
Serras vai serras vem
Seu cantar não tinha fim
O pastor cantava assim
Ó montes erguidos
Ó prados do mar em flor
Ó bosques antigos
Trajados de negra cor
Voa andorinha
Voa minha irmã
Não te vás embora
Vem volta amanhã
Dizei amigos
Dizei só a mim
Todos só de um lado
Quem vos fez assim
Dizei-me mil prados
Campinas dizei
A história que não contei
Serras vai serras vem
O seu mal não tinha fim
O pastor cantava assim
Ó montes erguidos
Ó prados do mar em flor
Ó bosques antigos
Trajados de negra cor
Voa andorinha
Voa minha irmã
Não te vás embora
Vem volta amanhã
Dizei amigos
Dizei só a mim
Todos só dum lado
Quem vos fez assim
Seu bem que ele vira
Num rio a banhar
Ao vê-lo vir espreitar
Nunca mais apareceu
Ao pastor de Bensafrim
Sua dor chorava assim
Ó montes erguidos
Ó prados do mar em flor
Ó bosques antigos
Trajados de negra cor
Voa andorinha
Não te vás embora
Vem volta amanhã
Dizei amigos
Dizei só a mim
Todos só dum lado
Quem vos fez assim
Quando a corja topa da janela
O que faz falta
Quando o pão que comes sabe a merda
O que faz falta
O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta
O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta
Quando nunca a noite foi dormida
O que faz falta
Quando a raiva nunca foi vencida
O que faz falta
O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é acordar a malta
O que faz falta
Quando nunca a infância teve infância
O que faz falta
Quando sabes que vai haver dança
O que faz falta
O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é empurrar a malta
O que faz falta
Quando um cão te morde a canela
O que faz falta
Quando a esquina há sempre uma cabeça
O que faz falta
O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é empurrar a malta
O que faz falta
Quando um homem dorme na valeta
O que faz falta
Quando dizem que isto é tudo treta
O que faz falta
O que faz falta é agitar a malta
O que faz falta
O que faz falta é libertar a malta
O que faz falta
Se o patrão não vai com duas loas
O que faz falta
Se o fascista conspira na sombra
O que faz falta
O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta
O que faz falta é dar poder a malta
O que faz falta
Ó Ti Alves
São poucas ou muntas
São poucas me menino
Mas prò ano
Já são mai muntas
Ó Ti Alves
São magras ou gordas
São magras me menino
Mas prò ano
Já são mai gordas
Ó Ti Alves
São pobres ou ricas
São pobres me menino
Mas prò ano
Já são mai ricas
Oh! que calma vai caindo (LP Contos Velhos, Rumos Novos, 1969)
Oh! que calma vai caindo
Sobre las gentes do campo
Meu amor que po lá anda
Encosta-te ao lírio branco
Andando eu a “ceifari”
Nas ladeiras do “ponsuli”
Não me venhas a “lembrari”
Menina da saia “azuli”
A rola se vai queixando
Que lhe roubaram os ovos
Naõ os puseras tu rola
Tanto ao pé dos meus olhos
Por cima ceifa-se o trigo
Por baixo fica o restolho
Menina não se enamore
De rapaz que embisga o olho
Já se está o sol a “pôri”
Para trás do cabecinho
Bem quisera o nosso amo
Prendê-lo com um baracinho
Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem
Para ver se embravecia
Cada vez fiquei mais manso
Bravo meu bem
Para a tua companhia
Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem
Com o meu vestido vermelho
O que eu vi de lá mais bravo
Bravo meu bem
Foi um mansinho coelho
As ondas do mar são branca
Bravo meu bem
E no meio amarelas
Coitadinho de quem nasce
Bravo meu bem
P’ra morrer no meio delas
Os eunucos devoram-se a si mesmos
Nao mudam de uniforme, sao venais
E quando os mais sao feitos em torresmos
Defendem os tiranos contra os país
Em tudo sao verdugos mais ou menos
No jardim dos harens os principais
E quando os mais sao feitos em torresmos
Nao matam os tiranos pedem mais
Suportam toda a dor na calmaria
Da olímpica visao dos samurais
Havia um dona a mais na satrapia
Mas foi lançado à cova dos chacais
Em vénias malabares à luz do dia
Lambuzam da saliva os maiorais
E quando os mais sao feitos em fatias
Nao matam os tiranos pedem mais
Os Fantoches de Kissinger (LP Com as Minhas Tamanquinhas, 1979)
Em toda parte baqueia
A muralha imperialista
Na ponta duma espingarda
Os povos da Indochina
Varrem da terra sangrenta
Os fantoches de Kissinger
Mas aqui também semeias
No pátio da tua fábrica
No largo da tua aldeia
A fome, a prostituição
São filhas da mesma besta
Que Kissinger tem na mão
Valor à Mulher Primeira
Na luta que nos espera
Só não há vida possível
Na liberdade comprada
Na liberdade vendida
A morte é mais desejada
A NATO não chega a netos
Abaixo o hidrovião
Na ponta duma espingarda
O Povo da Palestina
Mandou a Golda Meir
Uma mensagem divina
Da CIA não tenhas pena
Tem carne viva nas garras
É a pomba de Kissinger
Toda a América Latina
Se lembra das suas farras
A mesma tropa domina
A mesma tropa domina
Só um é embaixador
Mas nada nos abalança
A dormir sobre a calçada
Faz como o trabalhador
Dorme sobre a tua enxada
Faz como o atirador
Dorme sobre a espingarda
Os Índios da Meia-Praia (LP Com as Minhas Tamanquinhas, 1976)
Aldeia da Meia-Praia
Ali mesmo ao pé de Lagos
Vou fazer-te uma cantiga
Da melhor que sei e faço
De Monte-Gordo vieram
Alguns por seu próprio pé
Um chegou de bicicleta
Outro foi de marcha a ré
Quando os teus olhos tropeçam
No voo duma gaivota
Em vez de peixe vê peças
De ouro caindo na lota
Quem aqui vier morar
Não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra
Se constrói uma cabana
Tu trabalhas todo o ano
Na lota deixam-te mudo
Chupam-te até ao tutano
Chupam-te o couro cab’ludo
Quem dera que a gente tenha
De Agostinho a valentia
Para alimentar a sanha
De esganar a burguesia
Adeus disse a Monte-Gordo
(Nada o prende ao mal passado)
Mas nada o prende ao presente
Se só ele é o enganado
Oito mil horas contadas
Laboraram a preceito
Até que veio o primeiro
Documento autenticado
Eram mulheres e crianças
Cada um c’o seu tijolo
“Isto aqui era uma orquestra”
Quem diz o contrário é tolo
E se a má lingua não cessa
Eu daqui vivo não saia
Pois nada apaga a nobreza
Dos índios da Meia-Praia
Foi sempre a tua figura
Tubarão de mil aparas
Deixar tudo à dependura
Quando na presa reparas
Das eleições acabadas
Do resultado previsto
Saiu o que tendes visto
Muitas obras embargadas
Mas não por vontade própria
Porque a luta continua
Pois é dele a sua história
E o povo saiu à rua
Mandadores de alta finança
Fazem tudo andar pra trás
Dizem que o mundo só anda
Tendo à frente um capataz
E toca de papelada
No vaivém dos ministérios
Mas hão-de fugir aos berros
Inda a banda vai na estrada
Eram mulheres e crianças
Cada um c’o seu tijolo
“Isto aqui era uma orquestra”
Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não
Com papas e bolos
Engana o burlão
Os que de lá são
E os que pra lá vão
E os que pra lá vão
E os que pra lá vão
Ó flor da trapeira
Ó rosa em botão
Tuas cantaneiras
Bem bonitas são
Larga ó pescador
O que tens na mão
Que o peixe que levas
É do teu patrão
É do teu patrão
É do teu patrão
Limpa o teu suor
No camisolão
Que o peixe que levas
É do cais de Olhão
Vem o mandarim
Vem o capitão
Paga o pagador
Não paga o ladrão
Não paga o ladrão
Não paga o ladrão
Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não
Quem te pôs assim
Mar feito num cão
Foi o tubarão
Foi o tubarão
Foi o tubarão
Mulher empregada
Diz o povo vão
Que aquela empreitada
Não dá nada não
Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha da povo
Madrasta é que não
Madrasta é que não
Madrasta é que não
Ó pata descalça
Deixa-me da mão
Que os da tua raça
Já não pedem pão
Passa mais um dia
Todos lembrarão
Passa mais de um ano
Já não pedem pão
Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não
No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vêm em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas
São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhe franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Papuça
Paz Poeta e Pombas
Por Trás Daquela Janela
Olha enfia a carapuça
mas não compres o velho fato de ananás
o estilo não se empresta e nada tem sentido
a tua falta, meu papuça
Se podes tu não podes
Tanto faz
Experimenta sair
um pouco está bom tempo
na Arrábida para os ninhos
meu rapaz
Amanhã é feriado
em Paio Pires aguça
o teu ouvido rouco-mouco
em aguarrás
A multidão na rua
É Zé!
ouve-se a banda tocando
o M. F. A.
Vai o Borges o Pina o Xaimite e a Bibas
balouçando
A revolução é pra já
A bota trocada
o canta na varanda
De rota batida
para Luanda
Só menos um furo
no cinto apertado
É já Primavera
Amar não é pecado
na fímbria da saia
a lagartixa verde
E um dia alegre
À nossa espera, bebe
Estamos na seca
a paz é pouca
dorme uma soneca
a tia louca
Limpa os sovacos
com esse spray
amanhã é dia
de dancing day
Põe nessa boca
uma chupeta
amanhá é dia
de Dona Xepa
A Paz viajou em busca da silêncio
Sitiou Berlim
Abdicou em Londres
A Paz saltou dos olhos do poeta
Atacada de psicose maniaco-depressiva
Foi nessa altura que as pombas
Solicitaram nas agências as tarifas
Mas não viram mais o poeta
Que gozava na Suiça
Duma licença graciosa
A Paz saiu aos saltos para a rua
Comeu mostarda
Bebeu sangria
A Paz sentou-se em cima duma grua
Atacada de astenia
Foi nessa altura que as pombas
Solicitaram nas agências as tarifas
Mas não viram mais o poeta
Que gozava na Suiça
Duma licença graciosa
Por Trás Daquela Janela (LP Eu Vou ser Como a Toupeira, 1972)
Por trás daquela janela
Por trás daquela janela
Faz anos o meu amigo
E irmão
Não pôs cravos na lapela
Por trás daquela janela
Nem se ouve nenhuma estrela
Por trás daquele portão
Se aquela parede andasse
Se aquela parede andasse
Eu não sei o que faria
Não sei
Se a minha faca cortasse
Se aquela parede andasse
E grito enorme se ouvisse
Duma criança ao nascer
Talvez o tempo corresse
Talvez o tempo corresse
E a tua voz me ajudasse
A cantar
Mais dura a pedra moleira
E a fé, tua companheira
Mais pode a flecha certeira
E os rios que vão pró mar
Por trás daquela janela
Por trás daquela janela
Faz anos o meu amigo
E irmão
Na noite que segue o dia
Na noite que segue o dia
O meu amigo lá dorme
De pé
E o seu perfil anuncia
Naquela parede fria
Uma canção de alegria
No vai e vem da maré
Por trás daquela janela
Por trás daquela janela
Faz anos o meu amigo
E irmão
Não pôs cravos na lapela
Por trás daquela janela
Nem se ouve nenhuma estrela
Por trás daquele portão
Qualquer Dia
Quanto é Doce
Que Amor Não Me Engana
Quem Diz Que é Pela Rainha
No inverno bato o queixo
sem mantas na manhã fria
No inverno bato o queixo
Qualquer dia
Qualquer dia
No Inverno aperto o cinto
Enquanto o vento assobia.
No inverno aperto o cinto
Qualquer dia
Qualquer dia
No Inverno vou pôr lume
Lenha verde não ardia.
No inverno vou pôr lume
Qualquer dia
Qualquer dia
No Inverno penso muito
Oh que coisas eu já via
No inverno penso muito
Qualquer dia
Qualquer dia
No Inverno ganhei ódio
E juro que o não queria
No inverno ganhei ódio
Qualquer dia
Qualquer dia
Quanto é doce quanto é bom
No mundo encontrar alguém
Que nos junte contra o peito
E a quem nós chamemos mãe
Vai-se a tristeza o desgosto
Põe-se a um ponto na tormenta
Quando a mãe nos dá um beijo
Quando a mãe nos acalenta
E embora seja ladrão
Aquele que tenha mãe
Lá tem no meio da luta
Ternos afagos de alguém
Que amor não me engana
Com a sua brandura
Se de antiga chama
Mal vive a amargura
Duma mancha negra
Duma pedra fria
Que amor não se entrega
Na noite vazia
E as vozes embarcam
Num silêncio aflito
Quanto mais se a partam
Mais se ouve o seu grito
Muito à flor das águas
Noite marinheira
Vem devagarinho
Para a minha beira
Em novas coutadas
Junto de uma hera
Nascem flores vermelhas
Pela Primavera
Assim tu souberas
Irmã cotovia
Dizer-me se esperas
O nascer do dia
Quem diz que é pela rainha
Nem precisa de mais nada
Embora seja ladrão
Pode roubar à vontade
Todos lhe apertam a mão
É homem de sociedade
Acima da pobre gente
Subiu quem tem bons padrinhos
De colarinhos gomados
Perfumando os ministérios
É dono dos homens sérios
Ninguém lhe vai aos costados
Resineiro Engraçado
Rio Largo de Profundis
Ronda Das Mafarricas
Ronda dos Paisanos
Resineiro engraçado
Engraçado no falare
Ó I ó ai eu hei d’ir à terra dele
Ó I ó ai se ele me lá quiser levar
Já tenho papel e tinta
Caneta e mata borrão
Ó I ó ai p’ra escrever ao resineiro
Ó I ó ai que trago no coração
Resineiro é casado
É casado e tem mulher
Ó I ó ai vou escrever ó resineiro
Ó I ó ai quantas vezes eu quiser
Resineiro engraçado
Engraçado no falare
Ó I ó ai eu hei d’ir à terra dele
Ó I ó ai se ele me lá quiser levar
Rio largo de profundis
Uma neta pra nascer
Amor avenidas novas
Praça de Londres a arder
Não quero martelo e rima
Aqui no Largo da Graça
Quero ficar onde estou
Para salvar a quem passa
João, Francisco, Maria,
Cada qual um nome tem
Quando vos deu os bons dias
Ninguém responde a ninguém
Venha duma outra vontade
Lá eu soubera dizer
Amor avenidas novas
Praça de Londres a arder
Estavam todas juntas
Quatrocentas bruxas
À espera À espera
À espera da lua cheia
Estavam todas juntas
Veio um chibo velho
Dançar no adro
Alguém morreu
Arlindo coveiro
Com a tua marreca
Leva-me primeiro
Para a cova aberta
Arlindo Arlindo
Bailador das fadas
Vai ao pé coxinho
Cava-me a morada
Arlindo coveiro
Cava-me a morada
Fecha-me o jazigo
Quero campa rasa
Arlindo Arlindo
Bailador das fadas
Vai ao pé coxinho
Cava-me a morada
Ao cair da madrugada
No quartel da guarda
Senhor general
Mande embora a sentinela
Mande embora e não lhe faça mal
Ao cair do nevoeiro
Senhor brigadeiro
Não seja papão
Mande embora a sentinela
Mande embora a sua posição
Ao cair do céu cinzento
Lá no regimento
Senhor coronel
Mande embora a sentinela
Mande embora e deixe o seu quartel
Ao cair da madrugada
Depois da noitada
Senhor capitão
Mande embora a sentinela
Mande embora o seu guarda-portão
Ao cair do sol nascente
Venha meu tenente
Deixe a prevenção
Mande embora a sentinela
Mande embora e tire o seu galão
Ao cair do frio vento
Primeiro sargento
Junte o pelotão
Mande embora a sentinela
Mande embora e cale o seu canhão
Ao cair do sol doirado
Venha meu soldado
Largue o seu punhal
Vá-se embora sentinela
Vá-se embora que aí fica mal
Vá-se embora sentinela
Vá-se embora que aí fica mal
S. Macaio
Saudadinha
Se Voaras Mais Ao Perto
Senhor Arcanjo
Senhor Poeta
Senhora do Almortão
Senhora Que o Velho
Sete Fadas Me Fadaram
Só Houve O Brado Da Terra
S. Macaio, S. Macaio deu à costa
Ai deu á costa nos baixos da Urzelina
Toda a gente, toda a gente se salvou
Ai se salvou, só morreu uma menina
S. Macaio, S. Macaio deu à costa
Ai deu á costa naponta dos Mosteiros
Toda a gente, toda a gente se salvou
Ai se salvou, só morreu dois passageiros
S. Macaio, S. Macaio deu à costa
Ai deu á costa nas pedras da Fajazinha
Toda a gente, toda a gente se salvou
Ai se salvou, só morreu uma galinha
S. Macaio, S. Macaio deu à costa
Ai deu á costa nos baixos do Maranhão
Toda a gente, toda a gente se salvou
Ai se salvou, só o S. Macaio não
Ó Tirana saudade
Ó Tirana saudade
Ó Tirana saudade
Saudade, ó minha saudadinha
Foste nada no Faial
Foste nada no Faial
Foste nada no Faial
No Faial baptizada na Achadinha
Saudade onde tu fores
Saudade onde tu fores
Saudade onde tu fores
Saudade leva-me podendo ser
Que eu quero ir acabar
Que eu quero ir acabar
Que eu quero ir acabar
Saudade onde tu foras morrer
A saudade é um luto
A saudade é um luto
A saudade é um luto
Um amor, um amor, uma paixão
É um cortinado roxo
É um cortinado roxo
É um cortinado roxo
Que me morde, que me morde o coração
Se voaras mais ao perto
Poisavas noutra vidraça
Com o teu bico dentado
Trazias mais um na asa
Vem longe o dia da monda
Não é tempo de mondar
Ó Cigana ó ciganinha
Que eu te hei-de eu dar
Andorinha de asa preta
Vai gritando em altos brados
Chega-te à minha janela
Livra-me destes cuidados
Se voara como ela
A tua sorte era a minha
Diz-me lá ó ciganita
O que nos quer a andorinha
O que nos quer a andorinha
Bem gostara de saber
O mundo é bola de fogo
Nem todos ficam a arder
Senhor arcanjo
Vamos jantar
Caem os anjos
Num alguidar
Hibernam tíbias
Suspiram rãs
Comem orquídeas
Nas barbacãs
Entra na porta
Menina-faia
Prova uma torta
Desta papaia
Palita os dentes
Põe-te a cavar
Dormem videntes
No Ultramar
Que bela fita
Que bem não está
A prima Bia
De tafetá
E vai o lente
Come um repolho
Parte-se um pente
Fura-se um olho
A pacotilha
Tem mais amor
À gargantilha
Do regedor
Põe a gravata
Menino bem
Que essa cantata
Não soa bem
Senhor arcanjo
Vamos jantar
Caem os anjos
Num alguidar
E as quatro filhas
Do marajá
Vão de patilhas
Beber o chá
Meu amor é marinheiro,
E mora no alto mar,
Seus braços são como o vento,
Ninguém o pode amarrar.
Senhor poeta,
Vamos dançar,
Caem cometas,
No alto mar.
Cavalgam Zebras,
Voam duendes,
Atiram pedras,
Arrancam dentes.
Senhor poeta…
Soltam as velas,
Vamos largar,
Caem cometas,
No alto mar.
Senhora do Almortão
ó minha linda raiana
virai costas a Castela
não queirais ser castelhana
Senhora do Almortão
a vossa capela cheira
cheira a cravos, cheira a rosas
cheira a flor de laranjeira
Senhora do Almortão
eu pró ano não prometo
que me morreu o amor
ando vestida de preto
Senhora que o velho
Se quer levantar
Mofina de mim
Que o ouvi escarrar
Falar e tossir
Que o ouvi escarrar
Senhora vá-se embora
Vá já para fora
senão o papão
nos há-de engolir
Morde pela calada
Cheira à cruz gamada
Anda aí à solta
Não o deixes bulir
Senhora que o velho
Se quer levantar
Dá-lhe na corneta
Até se cansar
Mofina de mim
Bem o vejo trepar
Senhora que o velho
Tem corda de sino
Se lhe dão mais corda
Vai ao alto a pino
Anda aí à solta
Não o deixes bulir.
Sete fadas me fadaram
Sete irmãos m´arrenegaram
Sete vacas me morreram
Outras sete me mataram
Sete setes desvendei
Sete laranjinhas de oiro
Sete piados de agoiro
Sete coisas que eu cá sei
Sete cabras mancas
Sete bruxas velhas
Seter salamandras
Sete cega-regas
Sete foles
Sete feridas
Sete espadas
Sete dores
Sete mortes
Sete vidas
Sete amores
Sete estrelas me ocultaram
Sete luas, sete sóis
Sete sonhos me negaram
Aqui d´el rei é demais
Só ouve o brado da terra
Quem dentro dela
Veio a nascer
Agora é que pinta o bago
Agora é qu’isto
vai aquecer
Cala-te ó clarim da morte
Que a tua sorte
Não hei-de eu querer
Mal haja a noite assassina
E quem domina
Sem nos vencer
Cobrem-se os campos de gelo
Já não se ouve
O galo cantor
Andam os lobos à solta
Pega no teu
Cajado, pastor
Homem de costas vergadas
De unhas cravadas
Na pele a arder
É minha a tua canseira
Mas há quem queira
Ver-te sofrer
Anda ver o Deus banqueiro
Que engana à hora e
que rouba ao mês
Há milhões no mundo inteiro
O galinheiro é de
dois ou três
Tecto na Montanha
Tenho Barcos, Tenho Remos
Tenho Um Primo Convexo
Teresa Torga
Tinha Uma Sala Mal Iluminada
Traz Outro Amigo Também
Trovas Antigas
Tu Gitana
Num lugar ermo
Só no meu abrigo
Aí terei meu tecto
E meu postigo
De longe em longe
À luz das madrugadas
Duas camisas
Quem não tem lavadas?
Aí serei meu dono
E companheiro
Dizei amigos
Se não sou solteiro
E se eu morrer
O tecto que não caia
Porque um mendigo
Dorme de atalaia
De quando em quando
Chamo o perdigueiro
Dizei amigos
Quem chega primeiro
Aí terei meu poiso
À luz da veia
Aí verei o sol
Duma janela
Tenho uma trompa
Tenho uma cascata
Tenho uma estrela
No bairro da lata
Olha o mar alto
Olha a maresia
Olha a montanha
Vem rompendo o dia
Tenho barcos, tenho remos
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
E não lhe posso chegar.
Tenho navios no mar
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
Não o posso consolar.
Já fui mar já fui navio
Já fui chalupa escaler
Já fui moço, já sou homem
Só me falta ser mulher.
Só me falta ser mulher
Só me falta ser mulher
Já fui moço, já sou homem
Já fui chalupa escaler.
Tenho um primo convexo
Fadado para amnistias
Em torno de ele nadam
Plantas carnívoras
Agitando como plumas
As cordas violáceas
O meu primo dormita
Glu glu entre palmeiras
Suspenso numa rede
De suor e preguiça
Corvos bicam-lhe os pés
Trincam-lhe os calos
Enquanto a tarde jaz
E a mão suspende
O gesto de acordá-lo
E a terra treme
Mas de nada o meu primo se apercebe
No centro da Avenida
No cruzamento da rua
Às quatro em ponto perdida
Dançava uma mulher nua
A gente que via a cena
Correu para junto dela
No intuito de vesti-la
Mas surge António Capela
Que aproveitando a barbuda
Só pensa em fotografá-la
Mulher na democracia
Não é biombo de sala
Dizem que se chama Teresa
Seu nome e Teresa Torga
Muda o pick-up em Benfica
Atura a malta da borga
Aluga quartos de casa
Mas já foi primeira estrela
Agora é modelo à força
Que a diga António Capela
Teresa Torga Teresa Torga
Vencida numa fornalha
Não há bandeira sem luta
Não há luta sem batalha
Tinha uma sala mal iluminada
Perguntavas pelo amigo e estava a monte
A fuga era a última cartada
A pide estava ali mesmo defronte
As vezes uma dúvida rondava
Valia ou não a pena o que fazias?
Se alguém caía um outro alevantava
O tronco que tombava e renascias
A velha história ainda mal começa
Agora está voltando ao que era dantes
Mas se há um camarada à tua espera
Não faltes ao encontro sê constante
Há sempre quem se prante à tua mesa
Armado em conselheiro ou penitente
A luta agora está de novo acesa
E o caminho é só um é sempre em frente
Perdeste a treino falta-te a paciência
Ouviste antes do tempo mil fanfarras
Já os soldados fazem continência
Ao som do choradinho e das guitarras
A velha história ainda mal começa
Agora esta voltando ao que era dantes
Mas se há um camarada à tua espera
Não faltes ao encontro sê constante
Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras
Seja benvindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também
Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também
O que mais me prende à vida
Não é amor de ninguém
É que a morte de esquecida
Deixa o mal e leva o bem
Quem se vai casar ao longe
Ao perto tendo com quem
Alva flor da laranjeira
Não a dará a ninguém
Olha a triste viuvinha
Que anda na roca a fiar
É bem feito, é bem feito
Que não tem com quem casar
No cimo daquela serra
Está um lenço de mil cores
Está dizendo viva, viva
Morra quem não tem amores
O que mais me prende à vida
Não é amor de ninguém
É que a morte de esquecida
Deixa o mal e leva o bem
Olha a triste viuvinha
Que anda na roca a fiar
É bem feito, é bem feito
Que não tem com quem casar
Tu gitana que adivinhas
Me lo digas, poes no lo sê
Se saldre dessa aventura
Ô si nela moriré
Ô si nela perco la vida
Ô si nela triumfare
Tu gitana que adivinhas
Me lo digas, poes no lo sê
Um Homem Novo Veio da Mata
Utopia
Um homem novo
Veio da mata
De armas na mão
Não é soldado
De profissão
É guerrilheiro
Na sua aldeia
A mãe o diz
Duma fazenda
Faz um país
Colonialismo
Não passará
Imperialismo
Não passará
Veio da mata
Um homem novo
Do M. P. L. A.
Namíbia quente
Vai despertando
Da areia ao mar
Agora ou nunca
Não há que errar
Foi em Fevereiro
Na dia quatro
Sessenta e um
Angola existe
Povo há só um
Colonialismo
Não passará…
A cor da pele
Não é motivo
Pra distinguir
Angola nova
Só há que unir
Se novos donos
Querem pôr tronos
No teu país
Dum guerreiro
Faz um juiz
Colonialismo
Não passará…
Olha o caminho
Da Polissário
De Zimbabwé
África toda
Levanta-te
Se novos donos
Querem pôr tronos
Sobre o teu chão
Por cada morto
Nasce um irmão
Colonialismo
Não passará…
Cidade
Sem muros nem ameias
Gente igual por dentro
Gente igual por fora
Onde a folha da palma
afaga a cantaria
Cidade do homem
Não do lobo, mas irmão
Capital da alegria
Braço que dormes
nos braços do rio
Toma o fruto da terra
É teu a ti o deves
lança o teu desafio
Homem que olhas nos olhos
que não negas
o sorriso, a palavra forte e justa
Homem para quem
o nada disto custa
Será que existe
lá para os lados do oriente
Este rio, este rumo, esta gaivota
Que outro fumo deverei seguir
na minha rota?
Vai, Maria Vai
Vejam Bem
Venham Mais Cinco
Verdade e Mentira
Verdes São Os Campos
Vira de Coimbra
Viva o Poder Popular
Vai, Maria vai
Maria vai
Maria vai trabalhar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vai, Maria vai
Maria vai
A roupa branca lavar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vai, Maria vai
Maria vai
A roupa branca enxugar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vai, Maria vai
Maria vai
Aquele chão esfregar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vai, Maria vai
Maria vai
O meu menino calar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vai, Maria vai
Maria vai
Maria vai trabalhar
Não Senhora não
Senhora não
Senhora não, Maria
Vejam bem
que não há só gaivotas em terra
quando um homem se põe a pensar
quando um homem se põe a pensar
Quem lá vem
dorme à noite ao relento na areia
dorme à noite ao relento no mar
dorme à noite ao relento no mar
E se houver
uma praça de gente madura
e uma estátua
e uma estátua de de febre a arder
Anda alguém
pela noite de breu à procura
e não há quem lhe queira valer
e não há quem lhe queira valer
Vejam bem
daquele homem a fraca figura
desbravando os caminhos do pão
desbravando os caminhos do pão
E se houver
uma praça de gente madura
ninguém vai
ninguém vai levantá-lo do chão
Venham mais cinco
Duma assentada
Que eu pago já
Do branco ou tinto
Se o velho estica
Eu fico por cá
Se tem má pinta
Dá-lhe um apito
E põe-no a andar
De espada à cinta
Já crê que é rei
D’àquém e D’àlém Mar
Não me obriguem
A vir para a rua
Gritar
Que é já tempo
D’embalar a trouxa
E zarpar
A gente ajuda
Havemos de ser mais
Eu bem sei
Mas há quem queira
Deitar abaixo
O que eu levantei
A bucha é dura
Mais dura é a razão
Que a sustem
Só nesta rusga
Não há lugar
Pr’ós filhos da mãe
Não me obriguem
A vir para a rua
Gritar
Que é já tempo
D’embalar a trouxa
E zarpar
Bem me diziam
Bem me avisavam
Como era a lei
Na minha terra
Quem trepa
No coqueiro
É o rei
Neste livro do mundo
Quase perfeito
Preto e branco irmanados
De igual jeito
Quem não foi a tribunal
Quem teve mão
Nos juizes da Santa Inquisição
Em menino te ensinaram
mentiras que a morte leva
para outra morte bem longe
de pensares que outra contrária
Com a tua se aglomera
Neste livro de concórdia
Só tem guarida infinito
Por Giordano Bruno amado
Como se fora seu filho
Acima da besta fera
que na fogueira o lançava
aquela verdade brilha
à morte à morte diziam
os que não adivinhavam
que era verdade a mentira
Até o mar se acomoda
e paciente requebra
Enquanto gritas à toa
A tua verdade cega
Conta as areias da praia
O grande mago do mundo?
Só não mente quem não sente
Que o mistério não tem fundo
Verdes são os campos,
De cor de limão
Assim são os olhos
Do meu coração.
Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.
Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Dizem que amor de estudante
Não dura mais que uma hora
Só o meu é tão velhinho
Inda não se foi embora.
Coimbra pra ser Coimbra
Três coisas há-de contar
Guitarras, tricanas lindas,
Capas negras a adejar
Ó Portugal trovador
Ó Portugal das cantigas
A dançar tua dás a roda
A roda com as raparigas
Fui encher a bilha e trago-a
Vazia como a levei
Mondego que é da tua água
que é dos prantos que eu chorei.
Não há velório nem morto
Nem círios para queimar
Quando isto der prò torto
Não te ponhas a cavar
Quando isto der prò torto
Lembra-te cá do colega
Não tenhas medo da morte
Que daqui ninguém arreda
Se a CAP é filha do facho
E o facho é filho da mãe
O MAP é filho do Portas
Do Barreto e mais alguém
Às aranhas anda o rico
Transformado em democrata
Às aranhas anda o pobre
Sem saber quem o maltrata
Às aranhas te vi hoje
Soldado, na casamata
Militares colonialistas
Entram já na tua casa
Vinho velho vinho novo
Tudo a terra pode dar
Dêm as pipas ao povo
Só ele as sabe guardar
Vem cá abaixo ó Aleixo
Vem partir o fundo ao tacho
Quanto mais lhe vejo o fundo
Mais pluralista o acho
Os barões da vida boa
Vão de manobra em manobra
Visitar as capelinhas
Vender pomada da cobra
A palavra socialismo
Como está hoje mudada
De colarinho a Texas
Sempre muito aperaltada
Sempre muito aperaltada
Fazendo o V da vitória
Para enganar o proleta
Hás-de vir comigo a glória
O Willy Brandt é macaco
O Giscard é macacão
O capital parte o coco
Só não ri a emigração
De caciques e de bufos
Mandei fazer um sacrário
Para por no travesseiro
Dum cura reaccionário
Não sei quem seja de acordo
Como vamos terminar
Vinho velho vinho novo
Viva o Poder Popular.